27/01/2023

As relações dos grupos de extermínio com a extrema-direita e o bolsonarismo

Reproduzimos importante matéria do jornal A Nova Democracia sobre a relação patente entre os grupos de extermínio com a extrema direita e o bolsonarismo,tais grupos agem e se organizam militarmente com respaldo e incentivo das Forças Armadas reacionárias e setores do velho estado, que fazem vista grossa a seus crimes contra o povo e contra revolucionários brasileiros.

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As relações dos grupos de extermínio com a extrema-direita e o bolsonarismo

Após a bolsonarada de 8 de janeiro uma notícia chamou a atenção: um dos detidos se autodeclarou membro da Scuderie Le Cocq (SLC). 

Carro usado no atentado no Rio-Centro. Foto: Anibal Philot/Agência O Globo
                                                       

A SLC foi um grupo de extermínio fundado em 1965 no Rio de Janeiro, então estado da Guanabara. Foi formado inicialmente por policiais, que após a morte do detetive Milton Le Cocq, ex-integrante da guarda particular de Getúlio Vargas e primo do brigadeiro Eduardo Gomes, resolveram vingá-lo e assassinaram Manoel Moreira, o “Cara de Cavalo”, com mais de 60 tiros após invadirem durante a madrugada a casa onde estava. “O primeiro [tiro] para matar, o segundo para confirmar e o terceiro para fazer a festa”, teriam dito os executores. 

O emblema da Scuderie: uma caveira, dois ossos cruzados e a sigla “EM”, popularmente e na prática traduzida para ‘Esquadrão da Morte”.

O próprio governador na época, Francisco Negrão, declarava apoio extraoficial, chamando-os de “os 12 homens de ouro” que, segundo o Secretário de Segurança Pública, Luis França, “limpariam a cidade” eliminando criminosos, moradores de rua e travestis. São eles Aníbal Beckman dos Santos, o Cartola, Euclides Nascimento Marinho, Hélio Guahyba Nunes, Humberto de Matos, Jaime de Lima, Lincoln Monteiro, Mariel Mariscot de Matos, Nelson Duart, Neils Kaufman, o Diabo Loiro, José Guilherme Godinho, o Sivuca, Vigmar Ribeiro e Elinto Pires. 

Um ano antes da conformação da SLC instaurou-se o regime militar fascista no Brasil. Período em que os grupos de extermínio cresceram, atuando principalmente contra militantes revolucionários, progressistas e a resistência ao regime militar.

A relação dos grupos de extermínio e grupos paramilitares com o aparelho de repressão, atuando mesmo por dentro e participando como executores, está amplamente documentada. Se deu assim com a SLC, como também o funesto Comando de Caça aos Comunistas (CCC).

Além da motivação ideológica, convocados para eliminar “inimigos da pátria” (leia-se, inimigos do regime militar fascista), havia a busca pelo poder e enriquecimento fácil. Para cada execução os envolvidos ganhavam fortunas como recompensas de empresários apoiadores do regime militar fascista, e ainda dividiam entre si o que era apreendido.

“Tudo que era apreendido com os resistentes e tivesse algum valor, virava butim a ser rateado entre aqueles rapinantes. Jamais cogitavam, p. ex., devolver o dinheiro aos bancos que haviam sido expropriados pelos guerrilheiros urbanos [refere-se aos militantes revolucionários que travavam resistência armada na cidade]. Numerário, veículos, armas e até objetos de uso pessoal iam sempre para a  caixinha do bando. De mim, até os óculos roubaram.”, diz Celso Lungaretti ao falar do Capitão Guimarães, que era membro de um dos inúmeros grupos atuantes na repressão.

Em abril de 1973, Freddie Perdigão, o “Dr. Nagib”, coronel do Exército e um dos agentes mais sádicos do período, convocou um de seus "melhores homens" para levar o corpo de Merival de Araújo, comandante da ALN, e montar a farsa de “combate de rua” para justificar a execução por tortura, no Destacamento de Operações de Informação – Centro de Operações de Defesa Interna (Doi-Codi), localizado na Polícia do Exército da Barão de Mesquira, no Rio de Janeiro. 

 

Emblema da Scuderie Le Cocq. Imagem: Reprodução internet

O homem de confiança de Perdigão era Cláudio Guerra, delegado do Departamento de Ordem Política e Social (Dops), membro do alto escalão da SLC do Espírito Santo. Guerra foi autor de uma gama de execuções e desaparecimentos de militantes revolucionários, tendo confessado participação na chacina da Lapa (1976), onde foram executados Pedro Pomar e Ângelo Arroyo, dirigentes do PCdoB e da Guerrilha do Araguaia; assumiu o assassinato de Nestor Veras (Partido Comunista Brasileiro), de Ronaldo Mouth Queiroz (Ação Libertadora Nacional), Ranúsia Rodrigues (Partido Comunista Brasileiro Revolucionário), Almir Custódio, Ramires Maranhão e Vitorino Alves Moitinho. Também foi sabidamente responsável pela incineração de pelo menos dez corpos em uma Usina na cidade de Campos dos Goytacazes, trasladando os corpos, diversas vezes, da Casa da Morte em Petrópolis até o norte fluminense onde ficava a Usina. Guerra também participou de atentados no período chamado como “abertura democrática” com bombas no Estadão, no Rio Centro (1981), e a tentativa de explodir o avião onde se encontrava Fernando Gabeira.

Antes de iniciar sua participação na repressão, Cláudio Guerra já havia atuado em Governador Valadares (MG) e eliminado lideranças camponesas. 


Cláudio Guerra explica como os corpos eram incinerados quando atuava como delegado do Dops. Foto: Comissão Nacional da Verdade

Como delegado do Dops, Guerra se reportava diretamente ao Perdigão, membro do Centro de Informações do Exército (CIE), que em monografia de sua autoria expôs o funcionamento orgânico da “comunidade de informações”, que o Codi coordenava. Como se sabe, o Codi respondia diretamente ao chefe do Estado-maior do Exército da respectiva área de atuação. 

Segundo Guerra, Perdigão recrutou muitos “operadores” entre os membros da SLC. “Os militares manipulam várias forças clandestinas, entre elas a Le Cocq”.

A Scuderie que teve sede no Rio, em São Paulo e em Vitória, e que chegou a ter mais de 7 mil associados, entre policiais, advogados, juízes, promotores, empresários e comerciantes, teve o CNPJ de "instituição filantrópica" extinto em 2004.

Cláudio Guerra foi preso não pelos atos cometidos como agente da repressão, mas pela morte resultado de briga entre bicheiros no Espírito Santo. Hoje é pastor evangélico e escreveu uma autobiografia.

Mesmo após a extinção “oficial” do CNPJ da SLC e a proibição de uso dos seus símbolos, simpatizantes disseram tê-la refundado em 2017 no Rio de Janeiro, com cerca de 60 membros foram vistos incentivando moradores da zona sul a utilizarem um disque-denúncia para apontar casos de violência, e também atuando voluntariamente como segurança de evento no centro da cidade.

Um dos membros da primeira formação em 1964, o também delegado José Guilherme Godinho Sivuca Ferreira, de vulgo Sivuca, tornou-se deputado estadual do Rio de Janeiro em 1990 com o lema “bandido bom é bandido morto” e morreu aos 91 anos, de Covid-19.


José Guilherme Godinho Sivuca Ferreira, Sivuca, delegado da Polícia Civil e membro da Scuderie Le Cocq

Carlos Humberto Mannato, membro com carteirinha da SLC em 1992, foi candidato derrotado ao governo do Espírito Santo em 2022, participou ativamente da greve da Polícia Militar (PM) do estado em 2017. Como apoiador de Bolsonaro, foi nomeado em 2018 para o cargo de secretário especial para a Câmara dos Deputados da Casa Civil do governo militar de Bolsonaro e generais.


Ronnie Lessa, envolvido na execução de Marielle, foi membro da SLC. Foto: Reprodução

Outro sujeito bem conhecido e que possui carteirinha como membro da SLC é Ronnie Lessa, então vizinho de Jair Bolsonaro, em condomínio na Barra da Tijuca, RJ. Ele e seu ex-parceiro, Adriano da Nóbrega – este último apontado como chefe do grupo de extermínio conhecido como “Escritório do Crime” – são apontados como envolvidos na covarde execução da vereadora Marielle Franco, em março de 2018. 

Adriano da Nóbrega foi homenageado por Flávio Bolsonaro com a medalha Tiradentes. Não obstante, no gabinete de Flávio trabalharam a ex-esposa e a mãe de Nóbrega, Danielle Mendonça da Costa e Raimunda Veras Magalhães, respectivamente. Danielle e Raimunda receberam, ao todo, mais de R$ 1 milhão em salários, porém, pelo menos R$ 203 mil voltaram para o gabinete, através de Fabrício Queiroz, assessor de Flávio na época e ex-assessor de Jair Bolsonaro.

Já Ronnie Lessa é chefe de bandos paramilitares no Rio das Pedras, onde o amigo pessoal e ex-assessor da família Bolsonaro, Fabrício Queiroz, ficou foragido em 2018. Cabe lembrar que na casa de Ronnie Lessa, em março de 2019, foram encontrados 117 fuzis desmontados, o suficiente para armar uma companhia militar inteira.


Na foto, Flávio Bolsonaro ao lado de Humberto Fittipaldi (dir.), presidente refundador da SLC. Foto: Reprodução DCO

A atuação de bandos de delinquentes paramilitares como força de choque da extrema-direita e suas relações com as Forças Armadas não desapareceram com a mal chamada “redemocratização”. Essas hordas obscuras, assim como suas relações com os fascistas, não apenas permaneceram, como seguiram operando como tropa terrorista da contrarrevolução. A execução da vereadora Marielle Franco explicita seu móvel ideológico e operação política através da violência reacionária. Se admite-se que Bolsonaro está por trás desse movimento anticomunista que têm realizado intentonas e atentados para precipitar uma ruptura institucional – como todas as evidências apontam –, então é inegável que tais ações têm em seu núcleo operacional essa gente, de diferentes facções paramilitares.

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