16/05/2018

Documento Básico do MFP

A questão feminina e o marxismo

A história da humanidade tem sido, há milênios, desde o surgimento da propriedade privada, uma história de exploração e dominação de uma classe por outra, mas tem sido também, uma história de luta combativa dos explorados contra os exploradores. Desde então duas ideologias se confrontam: a dos opressores e a dos oprimidos. Na época contemporânea, na qual vivemos, as duas ideologias em confronto são a ideologia burguesa e a ideologia proletária. O marxismo é a ideologia do proletariado e hoje, mais desenvolvido, o marxismo-leninismo-maoísmo é a que ilumina a luta dos explorados, reafirmando que só com a revolução para a tomada do poder pelas classes exploradas é possível se libertar a Humanidade da exploração e dominação e se construir uma sociedade justa.

O Brasil é dominado pelo imperialismo (principalmente por Estados Unidos) e nosso povo é explorado pelos burgueses e latifundiários, classes serviçais do imperialismo. Isto acontece porque vivemos no sistema capitalista. Neste sistema, as mulheres operárias e camponesas são ainda mais exploradas que os homens porque, além de trabalharem para o sustento da família, mesmo recebendo sempre menos que os homens, ainda têm que assumir as tarefas de casa, que são muitas, pesadas e diárias. Além disto, os próprios homens operários e camponeses, influenciados pela ideologia burguesa dominante, têm muitos preconceitos em relação à mulher, considerando-a inferior a eles, achando-a incapaz de pensar e agir como eles.



Mas é preciso compreender que a opressão sobre as mulheres é uma opressão de classe. Ela está vinculada às relações de propriedade, ou seja: da condição de ser ou não proprietário dos meios de produção – ao capitalismo e à semifeudalidade, no nosso caso. E esta opressão existe há milênios, desde a sociedade escravista, passando pela feudal até o capitalismo. No capitalismo esta situação da mulher se alterou: ela passou a ter participação ativa no processo produtivo, pois o desenvolvimento das máquinas conduziu à inclusão da força de trabalho de mulheres e crianças. Isto permitiu que a mulher tomasse parte mais ativa na luta de classes.

No entanto, mesmo nas democracias capitalistas mais avançadas, onde vários direitos foram atendidos às mulheres, no fundamental - como diz Lênin – elas permanecem na lida caseira, são escravas do lar, vivem esgotadas pelas tarefas mais mesquinhas, mais ingratas, mais duras e mais embrutecedoras: a da cozinha e, em geral, a da economia doméstica familiar individual. Pois existe uma relação indissolúvel entre a posição social e humana da mulher e a propriedade dos meios de produção. Uma verdadeira emancipação da mulher somente é possível mediante o comunismo. O que quer dizer que, o problema da mulher é parte do problema social, do problema operário e sendo assim, está profundamente unido à luta proletária de classes e à revolução. [Clara Zetkin – “Lenin - Recordações sobre sua vida”

No momento histórico no qual nos encontramos, de desenvolvimento de novo ascenso do movimento popular, torna-se indispensável a organização das mulheres proletárias e camponesas principalmente, juntamente com suas aliadas da pequena-burguesia num vigoroso Movimento Feminino Popular, agregando a força da metade das classes oprimidas na luta revolucionária.

A fundação do Movimento Feminino Popular se deu com muita luta teórica e prática. Exporemos aqui nossa concepção sobre o problema feminino em seus diversos aspectos, baseada em nossos estudos com o objetivo de compreendermos os passos necessários ao desenvolvimento de uma organização de vanguarda e de massas de mulheres. Partindo da concepção científica da classe operária – o marxismo – aprofundamos o estudo para lograr uma compreensão correta da origem da opressão feminina; da concepção correta de sua luta pela emancipação; da necessidade de sua politização; da forma orgânica da qual se reveste esta luta e da importância em todos esses campos de combater com firmeza o reformismo e o oportunismo como concepção das classes dominantes, estabelecendo assim uma linha de massas para organizar a ação combatente, despertando a fúria revolucionária dos milhões de mulheres do povo em nosso país.

Origem da opressão feminina:
surgimento da propriedade privada, sociedade de classes


A concepção marxista define que a situação da mulher e do homem é condicionada pelo fato deles pertencerem à classe exploradora ou à classe explorada, sendo, portanto, essa a única condição que define a posição que cada um ocupa na sociedade: Para o marxismo, assim como o homem, a mulher é um conjunto de relações sociais historicamente organizadas e mutantes em função das variações da sociedade em seu processo de desenvolvimento; a mulher é, pois, um produto social e sua transformação exige a transformação da sociedade.

No estágio inicial de desenvolvimento da humanidade – denominado comunismo primitivo – anterior à existência da propriedade privada e da divisão da sociedade em classes antagônicas, a divisão social do trabalho ocorria de maneira natural, sem qualquer objetivo econômico, como acumulação ou herança. Os indivíduos dessas primeiras formações sociais (gens) não tinham ainda acumulado bens de riqueza, viviam da coleta de frutos e da caça. Mulheres e homens exerciam funções diferenciadas, porém de importância equivalente no processo geral de produção dos bens necessários à sobrevivência.

Sendo assim, era natural que um número maior de indivíduos masculinos das gens exercesse a função da caça e da conquista de novos territórios, uma vez que a maioria das mulheres, devido a seu papel na reprodução da espécie (gestação, amamentação dos filhos), estivesse muitas vezes impossibilitada de caçar, cabendo-lhes outras tarefas. Nesse período histórico esta divisão natural de tarefas não implicava em nenhuma desvalorização da mulher ou sobrevalorização do homem. A descendência humana neste período era baseada no matriarcado, pois os indivíduos se relacionavam por grupos e por pares, sendo por isso a filiação conhecida apenas a partir da mãe.

Produção de excedentes

No estágio superior da barbárie, que precede o surgimento da civilização, o ser humano progride em seu domínio sobre a natureza: desenvolve instrumentos de trabalho, o pastoreio, a agricultura e a produção de utensílios, obtendo com isto um excedente na produção dos meios materiais de sua subsistência. Pode obter a carne sem o esforço permanente da caça. Pode colher alimentos a partir do plantio. Confecciona ferramentas e objetos de uso de maior complexidade. Com a obtenção desse excedente se desenvolverá mais a divisão do trabalho, a troca.

Esse desenvolvimento, entretanto, é desigual, tanto dentro de uma mesma gen quanto entre diferentes gens. Ademais, os homens, em função da divisão natural de trabalho, aparecerão na história como os primeiros detentores do excedente da produção. Nem todos os homens acumularam excedentes, mas o excedente acumulado está principalmente nas mãos de homens.

Surgimento da propriedade privada, da sociedade de classes antagônicas

Surgirá a partir daí, a propriedade privada, a mercadoria e a apropriação da produção por uma parte da sociedade, dividindo-a em classes proprietárias e classes expropriadas, classes exploradoras e classes exploradas: um pequeno contingente que se constitui em classe dominante e a grande maioria, os produtores, que compõe a classe dominada.

Herança: fim do matriarcado, início do patriarcado

Quando não havia propriedade privada sobre os utensílios e instrumentos de trabalho utilizados por homens e mulheres, jamais se colocara a questão da herança. Com a produção do excedente, da riqueza, a questão da herança surge pela primeira vez na história da humanidade e junto com ela a necessidade de se conhecer a filiação a partir dos pais. Em função da herança dá-se o fim do matrimônio por grupos ou pares, impõe-se o casamento monogâmico.

Em sua obra A Origem da Família da Propriedade Privada e do Estado, Engels descreve como se processou esta transformação:

Dessa forma, pois, as riquezas, à medida que iam aumentando, davam, por um lado, ao homem uma posição mais importante que a da mulher na família, e, por outro lado faziam com que nascesse nele a idéia de valer-se desta vantagem para modificar, em proveito de seus filhos, a ordem de herança estabelecida. Mas isso não poderia se fazer enquanto permanecesse vigente a filiação segundo o direito materno. Esse direito teria que ser abolido e o foi. E isto não foi tão difícil quanto hoje nos parece. Tal revolução – uma das mais profundas que a humanidade já conheceu – não teve necessidade de tocar em nenhum dos membros vivos da gens. Todos os membros da gens puderam continuar sendo o que até então haviam sido. Bastou decidir simplesmente que, de futuro, os descendentes de um membro masculino permaneceriam na gens, mas os descendentes de um membro feminino sairiam dela, passando à gens de seu pai. Assim foram abolidos a filiação feminina e o direito hereditário materno, sendo substituídos pela filiação masculina e o direito hereditário paterno.

Essas conclusões são resultado de pesquisas baseadas na observação de tribos aborígenes existentes ainda em nossos dias. A passagem do matriarcado para o patriarcado, portanto, está intimamente ligada ao surgimento da propriedade privada e interessou à mulher por dois motivos principais: também era de seu interesse que seus filhos herdassem as riquezas do pai e o casamento monogâmico (necessário para definir a linhagem paterna), é visto por ela como uma forma de união muito mais confortável. Obviamente que as conseqüências nefastas dessa nova situação não podiam ser antevistas por nossas antepassadas, e como prossegue Engels:

O desmoronamento do direito materno foi a grande derrota histórica do sexo feminino em todo o mundo. O homem apoderou-se também da direção da casa; a mulher viu-se degradada, convertida em servidora, em escrava da luxúria do homem, em simples instrumento de reprodução. Essa baixa condição da mulher, manifestada sobretudo entre os gregos dos tempos heróicos e, ainda mais, entre os dos tempos clássicos, tem sido gradualmente retocada, dissimulada e, em certos lugares, até revestida de formas de maior suavidade, mas de maneira alguma suprimida.

Sociedade dividida em classes antagônicas e não em gêneros

As novas relações de propriedade, portanto não dividiram a sociedade em homens e mulheres e sim em classes sociais, passando a existir homens e mulheres da classe exploradora e homens e mulheres das classes exploradas.

Organização do Estado

É importante ainda destacar que, com a divisão da sociedade em classes sociais antagônicas surge a organização do Estado como instrumento especial da classe dominante para exercer a repressão sobre a classe dominada e assim assegurar sua subjugação para a exploração de seu trabalho.

É neste momento que se dá a origem da opressão feminina, tendo como base o aparecimento da propriedade privada, a consequente acentuação da divisão do trabalho e divisão da sociedade em classes sociais antagônicas.

A mulher sofre dupla opressão: de classe e de gênero


O surgimento do patriarcado como conseqüência da propriedade privada, atinge nossos dias e para fazê-lo valer foi necessário alterar tradições ancestrais do respeito à mulher no comunismo primitivo, substituindo-as por outras aplicadas a partir do ponto de vista da sociedade de classes. Dessa maneira, as mulheres passaram de imediato a sofrer dois tipos de opressão: sua opressão enquanto classe e a outra enquanto gênero. E essa opressão, enquanto mulher, é claro, não atinge de maneira igual a todas as mulheres da sociedade. Sua intensidade e seus efeitos são relativos a pertencerem à classe explorada ou à classe exploradora. Como afirmou o grande marxista peruano, José Carlos Mariátegui:

As mulheres, como os homens, são reacionárias, de centro ou revolucionárias. Não podem, portanto, combater juntas a mesma batalha. No atual panorama humano, a classe diferencia os indivíduos mais que o sexo.

Essa é a tese fundamental do marxismo sobre a causa feminina. A opressão da mulher está intimamente ligada ao aparecimento da sociedade de classes, em última instância ao surgimento da propriedade privada. Ao ressaltar que a opressão específica da mulher tem como causa a formação, surgimento e desenvolvimento do direito de propriedade sobre os meios de produção, esta tese demonstra que sua emancipação está ligada à destruição deste direito.

O caminho da emancipação da mulher 


Movimento feminino revolucionário X Feminismo pequeno-burguês

Nas últimas décadas debate-se muito sobre o aumento da participação social da mulher. As organizações feministas pequeno-burguesas propagandeiam como conquistas as políticas públicas voltadas para as mulheres, as quotas obrigatórias de candidatas nas eleições, a ocupação por mulheres de cargos de direção no mercado empresarial e de postos na máquina de Estado e de governos. O principal argumento usado pelas feministas para defender a importância desta participação, além do direito da mulher como cidadã, é que as mulheres têm uma “sensibilidade especial” conferida por características próprias do gênero. As mulheres são melhores que os homens? Um mundo mais feminino seria mais humano, menos injusto?

A tese reacionária da natureza feminina e sensibilidade especial das mulheres

O argumento da “sensibilidade especial” das mulheres, aparentemente novo, tem a idade da sociedade de classes. Ao longo dos diferentes estágios dessa sociedade, desenvolveu-se uma pseudoteoria da “natureza humana”, que nega a luta de classes, a contradição inconciliável entre os seres humanos das classes exploradoras e das classes exploradas, opressores e oprimidos. A partir dessa premissa afirma-se a concepção de que sempre houve pobres e ricos, que a divisão social existente é uma fatalidade inevitável, faz parte da natureza humana. Como variante dessa “teoria”, idealista e reacionária, apresenta-se a tese da “natureza feminina” (que nos tempos antigos fazia-se acompanhar do adjetivo “deficitária”). O objetivo é o mesmo: afirmar que existe uma natureza feminina em geral (características próprias de gênero, inerentes a todas as mulheres) eterna e imutável.

O feminismo burguês retira o adjetivo “deficitária”, ou melhor, troca-o por “sensibilidade especial”, não alterando em nada a essência idealista e reacionária. Por quê? Porque fogem de uma análise de fundo, da origem da opressão sexual sobre a mulher, defendendo que basta que nós ocupemos os “espaços democráticos” e o mercado de trabalho, provando inclusive que somos melhores. Por que as mulheres em geral seriam melhores que os homens? Uma latifundiária tem mais “sensibilidade” para tratar o problema agrário e camponês? Ela não expulsaria aqueles que tomassem suas terras? As empresárias exploram menos seus operários, pagam-lhes melhores salários? As mulheres parlamentares fazem leis mais justas e são menos corruptas? As juízas são mais justas que seus colegas homens? As policiais femininas são menos violentas ao reprimir o povo?

O mundo não tem que ser nem mais nem menos feminino para ser mais justo. Entendemos por mundo mais justo, o fim da exploração do ser humano pelo ser humano, o fim desta sociedade de homens e mulheres exploradores, sugando o suor de homens e mulheres explorados.

Emancipação X Libertação

O problema da concepção feminista é de aparentar reduzir a causa da opressão da mulher ao patriarcado. Isto não é mais que uma concepção burguesa. Ao se recusar ver que as raízes do patriarcado estão na sociedade de classes e que ele vem se perpetuando desde o escravismo, feudalismo e etapa imperialista do capitalismo, o feminismo defende que a luta feminista é de todas as mulheres, independente da classe social a que pertençam. Sendo assim, advogam que é possível alcançar os direitos das mulheres na sociedade de classes, no capitalismo. Portanto, para esta concepção trata-se simplesmente de lutar pela igualdade com os homens para ser revogada a opressão particular das mulheres. Só que a luta contra o patriarcado sem levar a luta contra a exploração de classe é puro engodo. É necessário combater esta concepção porque sua difusão gera um grande obstáculo, não só para a participação mais efetiva das mulheres na luta revolucionária proletária, como traz um prejuízo enorme para a luta proletária em geral, na medida em que as mulheres trabalhadoras são a metade da classe, das massas populares e nelas reside uma força poderosa que precisa ser liberada para impulsionar a revolução. O feminismo pequeno-burguês se afirma somente na aparente luta contra o patriarcado e não contra a exploração e opressão de classes. A concepção marxista, afirma que o patriarcado é conseqüência da sociedade de classes antagônicas e que só acabará quando construirmos uma sociedade livre da exploração e opressão de uma classe sobre outra. 

A ação do movimento feminino revolucionário não é uma atividade paralela ou solidária à luta do povo. Somos parte das classes que compõem nosso povo: proletários, camponeses, estudantes, intelectuais comprometidos com as causas populares. A causa feminina pertence ao proletariado, ao campesinato, às classes oprimidas e exploradas em todo o mundo. As chamadas bandeiras específicas das mulheres – creches para nossos filhos, salário igual para trabalho igual, fim da violência sexual e doméstica, combate à visão da mulher como objeto sexual, descriminalização do aborto –, pertencem também aos homens de nossa classe. Estamos na vanguarda dessas lutas por sermos as que sofremos diretamente na pele a dupla opressão – de classe e de gênero, porém os homens das classes trabalhadoras também precisam elevar sua consciência de que esta falta de direitos tem reflexos na vida do conjunto das classes oprimidas e exploradas pelo capital. 

O movimento feminino revolucionário deve levar junto da luta de classes, na luta pelo programa revolucionário, todo esclarecimento e lutar contra todas as manifestações de discriminação, opressão e violência contra as mulheres. Estas lutas, de forma geral, não podem se dar separadas da luta revolucionária, pois a causa que as engendram é uma só: a exploração de classe, enfim a propriedade privada. 

Assim sendo, a tese da libertação feminina nos marcos da sociedade de propriedade privada é uma tese burguesa. E por isso mesmo deve ser combatida implacavelmente. Pois, libertação das mulheres de quem? Dos homens de sua própria classe? Esta tese se desmascara cada vez mais como feminismo burguês, que coloca como contradição principal a luta entre homens e mulheres omitindo a origem de classe dessa opressão. Com sua proposta de “união de todas as mulheres” exploradas e exploradoras, o feminismo divide o movimento popular e afasta as mulheres do povo da luta contra a opressão. O feminismo burguês, na verdade, encobre o problema e legitima as instituições carcomidas deste velho Estado, instrumento do imperialismo e das classes reacionárias, opondo-se assim ao desenvolvimento de um movimento feminino popular, classista e revolucionário, sob a direção e condução do proletariado revolucionário.

Conquistas das mulheres trabalhadoras no capitalismo

Se compararmos a condição da mulher no início do capitalismo com as condições atuais, verificaremos que muita coisa mudou. Uma série de conquistas, mesmo que restritas às classes dominantes e às camadas de classe média terminam por alcançar também as mulheres trabalhadoras. O movimento feminista comemora a entrada da mulher no mercado de trabalho como uma conquista, ao lado do direito ao estudo universitário, onde em algumas áreas as mulheres são maioria hoje; do divórcio; do fim do pátrio poder, entre outras. É claro que houve avanços. E todos eles são fruto de muita luta da classe operária, principalmente, e das demais classes trabalhadoras. É importante, porém, ressalvar que a entrada da mulher na produção capitalista não foi necessariamente uma conquista, não partiu de uma reivindicação da classe. Pelo contrário, o desenvolvimento do maquinário, tornando supérflua a força física, permitiu ao capitalismo explorar a força de trabalho feminina e infantil. Como afirma Karl Marx:

“o gigantesco instrumento criado [o maquinário] para eliminar trabalho e operários converteu-se imediatamente em meio de multiplicação do número de assalariados, colocando todos os indivíduos da família operária, sem distinção de idade nem sexo, sob a dependência imediata do capital.”

Esta situação, portanto, não significou uma melhoria nas condições de vida das classes trabalhadoras, pois o que fez o capitalismo foi dividir entre todos os membros trabalhadores da família o salário do antigo chefe da família. Já que o maquinário diminuiu a força física empregada na produção, o salário foi depreciado. Assim, uma família que antes era sustentada por um salário do homem, passa a receber três salários, por exemplo, com a entrada da mulher e do filho. Porém, o montante a ser pago aos três é igual ao que se pagava ao operário sozinho antes do maquinário. A grande indústria ampliou o número de trabalhadores e aumentou também o grau de exploração sobre a classe.

Aumento do contingente feminino na produção industrial e agrícola

É necessário destacar o grande contingente social que representa hoje em nosso país a mulher trabalhadora. São dezenas de milhões. Massas populares constituídas por operárias, trabalhadoras em serviços, vendedoras ambulantes, empregadas domésticas, comerciárias e muitas outras assalariadas. Entre essas mulheres, como resultado da degeneração do sistema capitalista em sua fase imperialista, há um gigantesco e crescente contingente de mulheres pobres que são chefes de família, separadas de seus maridos ou mães solteiras, principalmente jovens, que têm de se virar sozinhas na batalha pela sobrevivência de seus filhos. Todo este contingente representa um tremendo potencial revolucionário, que na verdade é a grande conquista dos trabalhadores com a entrada da mulher na produção.

Verdadeira conquista da mulher trabalhadora com seu ingresso na produção: consciência de classe somando-se à luta de todos os trabalhadores

O que a mulher trabalhadora ganha com seu ingresso no processo produtivo é algo muito maior do que o celebrado pelas feministas burguesas. A mulher operária amplia seus horizontes para muito além da cerca doméstica, ganha consciência de classe, desenvolve sua politização, entra na cena da luta de classes ao lado de seus companheiros de infortúnio, agregando uma força fabulosa à luta de todos os trabalhadores. O capitalismo amplia a exploração sobre toda a classe operária com o ingresso da mulher na produção, porém, ao mesmo tempo cria as bases materiais para que a mulher lute por seus direitos, o que é um ponto de partida para sua emancipação.

As mulheres do povo são capazes de matar e morrer para defender seus filhos e historicamente têm dado mostras de sua heroica combatividade nas lutas populares. Mas, certamente, ao compreenderem a origem de sua opressão e exploração milenar em todo o mundo, através da participação nos movimentos revolucionários de sua classe, entre eles o movimento feminino sob a direção do proletariado, elevam sua condição de combatente defendendo não apenas seus filhos, mas os filhos do povo, toda a sua classe.

Quanto às outras conquistas, são resultado direto dessa contradição. O divórcio e o fim do pátrio poder, por exemplo, foram conquistados pelas mulheres na revolução burguesa na França em 1789. Tão logo a burguesia instalou-se no poder retirou esses direitos por representarem ameaça à propriedade privada. O acesso à universidade, reivindicado já no século XIX, pouco representava àquela época e segue representando pouco para as mulheres operárias e camponesas, que só chegarão massivamente à universidade quando sua classe estiver no poder.

O feminismo burguês se afirma somente na luta contra o patriarcado e não contra a exploração e opressão de classes. A concepção marxista, afirma que o patriarcado é consequência da sociedade de classes antagônicas e que só acabará quando construirmos uma sociedade livre da exploração e opressão de uma classe sobre outra.

A mulher jamais se libertará ou será completamente emancipada dentro do sistema de exploração capitalista. Em primeiro lugar, porque quando falamos em libertação estamos falando de toda a classe. Em segundo lugar, porque a emancipação da mulher não significa apenas a incorporação de um grande número de mulheres à produção. É necessário que o conjunto, que todas as mulheres sejam incorporadas e em condições de igualdade com o homem. Para isso é fundamental atacar a raiz dessa desigualdade, que o trabalho doméstico seja reduzido ao mínimo possível, capaz de ser realizado por homens e mulheres, ao ponto de não representar uma sobrecarga para nenhum dos dois. E isso não ocorrerá no capitalismo, pois por mais que a produção cresça em determinados momentos, o sistema não pode e não quer incorporar toda a população pobre à produção e de maneira especial não o fará com todas as mulheres. Muito menos ainda abrir mão do trabalho não pago da mulher trabalhadora, transformando o trabalho doméstico em indústria social (creches, lavanderias coletivas, restaurantes coletivos): a unidade econômica representada pela família é condição da qual o sistema não abre mão, pois ela potencializa a extração da mais-valia ampliando em níveis altamente rentáveis a exploração da força de trabalho. [ver: Trabalho doméstico]

O que afirmamos e reiteramos é que o capitalismo senta as bases para a emancipação das mulheres trabalhadoras, quando incorpora parte delas na produção, uma vez que ao fazer isso inevitavelmente lança-as na luta de classes. Assim as mulheres iniciam sua participação política nos sindicatos operários e ligas camponesas, em organizações populares e estudantis, até a militância revolucionária organizada, politizando-se e elevando sua consciência de classe.

A emancipação das mulheres passa pela revolução democrática ininterrupta ao socialismo

Em decorrência do caráter de classe da opressão feminina, a emancipação da mulher só pode se realizar de fato através da emancipação de toda a sua classe.

Somente a revolução social, a revolução proletária socialista que derroca o capitalismo e constrói o socialismo pode conduzir à emancipação da mulher e a esta completar-se com o advento do comunismo. Para alcançar sua emancipação, as mulheres trabalhadoras devem lutar lado a lado com seus irmãos de classe explorada pela emancipação social, criando assim as bases materiais e subjetivas para sua completa emancipação.

Na sociedade socialista as massas de mulheres são integradas na produção social, as atividades domésticas são industrializadas, entre um conjunto de medidas que libertam objetivamente a mulher trabalhadora da escravidão doméstica, além da plena igualdade jurídica com o homem.[ Ver: “Transformação revolucionária do trabalho doméstico em indústria social - A experiência da República Popular da China”]

Mas, somente com a passagem ao estágio superior do socialismo, o comunismo, quando não mais existirão classes sociais antagônicas, aí sim, a emancipação da mulher será completa.

As concepções burguesas e pequeno-burguesas afirmam que a “libertação da mulher” se dará pela via da luta e disputa com os homens por equiparar-se na sociedade; por uma suposta igualdade de direitos debaixo da exploração e opressão capitalistas, através da “união do sexo feminino”, ou da suposta “sensibilidade especial” das mulheres.

Ao contrário, afirmamos que somente através da revolução proletária a emancipação da mulher ser realizada. Só com emancipação da classe proletária conquistando o socialismo e o comunismo terá fim toda opressão sobre a mulher. No caso do Brasil, como corresponde o caminho da revolução socialista passa pela revolução de Nova Democracia, que se desencadeia como Revolução Agrária.

O trabalho doméstico


A função da família das classes oprimidas no capitalismo é cuidar, alimentar, educar, repor a força de trabalho dos operários, camponeses e trabalhadores em geral de maneira que eles atendam às condições da exploração capitalista e latifundiária. Garantir que a família trabalhadora se reproduza enquanto classe explorada física, intelectual, moral e politicamente.

O trabalho doméstico é “invisível”

Essa batalha cotidiana imposta às mulheres é denominada por nós de “trabalho invisível”. A chamada “dona-de-casa”, é a primeira que levanta, prepara a comida de todos da casa e é a última que come. Limpa, lava na beira do tanque ou do rio, cuida dos filhos, enfrenta os cobradores na porta, socorre-se na vizinha porque as latas estão vazias, corre ao posto médico com o menino febril, ganhando em troca desta rotina as varizes e lombalgias. Quando ao final do dia, senta-se pela primeira vez, a maioria delas diante da televisão como fuga da imensidão de problemas, a casa já está toda desarrumada, os meninos já estão sujos, a pia já está cheia de louça, e ninguém verá o trabalho feito que recomeçará todos os dias. Quando se pergunta a uma mulher que não trabalha no mercado formal e se esfalfa no trabalho doméstico se ela trabalha, a resposta é NÃO. Ela própria não vê o trabalho que faz, ou não o reconhece como trabalho, levada que é a acreditar que essas tarefas seriam uma sina secular do sexo feminino.

Trabalho doméstico é trabalho não pago

Dessa forma, a exploração dos trabalhadores extrapola a fábrica invadindo seu lar. Para entender este problema é necessário compreender que o salário do operário não é mais que o necessário à sua sobrevivência e reprodução. Quando a mulher cozinha, lava, passa, cuida dos filhos e dos idosos da família, e executa uma infinidade de outras tarefas domésticas, garante a reprodução da força de trabalho para as classes exploradoras na forma de trabalho gratuito, não pago. Os salários podem ser mantidos em níveis baixíssimos, uma vez que o empregador não precisa desembolsar nem um tostão para garantir seu empregado alimentado e vestido no dia seguinte deixando seus filhos cuidados em casa. É assim que o capitalista explora o operário de duas formas: na fábrica, com pouca paga, e em sua casa, através da exploração do trabalho não pago da mulher.

As relações sociais e de produção no campo são ainda mais arcaicas e retrógradas. O assalariamento é totalmente precário e aparente, o que vigora são as formas semifeudais como as parcerias de “meia”, de “terça”, o pequeno arrendo, etc. A pequena exploração camponesa é inseparável da economia doméstica e da escravidão da mulher, que é responsável direta por grande parte da pequena produção, desde a lavoura ao cuidado dos animais, além de todas as tarefas do lar. Esta situação mantém a mulher camponesa mais subjugada que a operária, acorrentada pelas mais humilhantes condições, nas quais impera, pelos costumes seculares, sua inferioridade em relação ao homem, tendo de se submeter e se subordinar a ele por completo na vida familiar, favorecendo enormemente a exploração da classe camponesa pelo latifúndio.

O trabalho doméstico é dupla jornada


No caso da mulher trabalhadora da cidade e do campo, a exploração é dupla, pois o ingresso da maioria esmagadora das mulheres na produção não foi acompanhado de nenhum benefício que as alivie do trabalho doméstico. Além de executarem esse exaustivo e diário trabalho, cumprem jornadas de trabalho fora de casa, recebendo ainda salários inferiores aos homens pelo mesmo trabalho executado. Ao contrário, as mulheres das classes dominantes exploram as mulheres das classes oprimidas como empregadas domésticas, diaristas, cuidadoras de crianças e idosos.


Transformação revolucionária do trabalho doméstico em indústria social
A experiência da República Popular da China


A experiência da construção socialista na Rússia (depois União Soviética), a partir de 1917 até 1956, é muito rica assim como na China socialista, de 1949 até 1976, onde assistimos pela primeira vez na história à transformação do trabalho doméstico em indústria social.

O desenvolvimento de uma indústria social que desmistifica o trabalho doméstico e o socializa foi uma das obras imensas da revolução chinesa desde seus primeiros momentos. O funcionamento das oficinas de serviços e outras atividades substituem e tornam coletivo o trabalho doméstico em toda sua amplitude: lavar, passar, arrumar casa, cozinhar, cuidar dos filhos, costurar, consertar roupas e toda uma infinidade de afazeres antes colocados exclusivamente sobre os ombros da mulher.

Equipes de limpeza das casas

As famílias saíam para o trabalho e uma equipe vinha até sua casa limpá-la.

Lavanderias coletivas

As roupas por lavar, passar ou consertar eram apanhadas em casa e levadas para as oficinas especializadas.

Restaurantes coletivos

As refeições eram feitas nas fábricas e escolas, ou nos restaurantes coletivos construídos dentro dos conjuntos habitacionais.

Creches

O cuidado com as crianças era fundamentalmente responsabilidade das creches (que funcionavam 365 dias no ano durante 24 horas) e escolas públicas, onde a educação socialista afiançava a formação de crianças saudáveis física e ideologicamente.

Este funcionamento das creches permitia aos pais, participar de atividades após seu horário de trabalho como estudo em geral, participação em congressos, palestras e debates e atividades culturais.

Participação dos idosos na construção da nova sociedade

Os idosos não mais representavam um peso para a sociedade e cumpriam tarefas em diversos locais, desde as oficinas de limpeza e conserto até o trabalho em horários variados em fábricas. Entretanto, muitos trabalhavam especialmente apoiando o processo de ensino das crianças e jovens, valorizados em sua larga experiência de vida, como testemunhas vivas da antiga sociedade, transmitindo sua experiência e crítica sobre ela e apoio à nova sociedade que se construía. 

Indústria social do trabalho doméstico o torna um trabalho visível

Ao coletivizar o trabalho doméstico, este deixa de ser “invisível”, aparece claramente como uma produção como outra qualquer, demonstrando que esta carga sobre os ombros da mulher não é um destino assinalado pela “natureza feminina” e sim a forma de organização capitalista que o utilizava como método de exploração.

Ao ser assumido por homens e mulheres, na nova sociedade, passa a ser visto como trabalho e não “ocupação das mulheres” como na sociedade capitalista. A satisfação dos homens em participar voluntariamente dessas oficinas, tanto nos trabalhos como na construção de novos prédios para abrir novas oficinas, é um testemunho desse salto.

A coletivização socialista desse trabalho dá pela primeira vez a ele o caráter de trabalho útil e necessário a todos, conferindo-lhe o reconhecimento social. Acaso podemos pensar nesta forma de organização social dentro do capitalismo?

Participação na vida política do país

Homens, jovens e mulheres aprendem a reconhecer a importância deste trabalho e não mais são menosprezados por realizá-lo. As equipes de bairro responsáveis pelos diversos setores deste trabalho têm participação ativa e massiva na vida política, organizadas como qualquer outra unidade de produção. Participam de debates sobre a situação internacional, discutem posições do governo e as questões decisivas na construção do socialismo, o papel da mulher na revolução, etc. Da mesma forma, antigas “donas-de-casa”, mulheres de cinqüenta anos, tomam parte de grupos de estudo do marxismo-leninismo-pensamento Mao Tsetung, atividade que se converteu em movimento pujante na China.

Atividades culturais

A vida cultural dos bairros se baseia nestas equipes. Elas foram responsáveis pela criação de muitos grupos de artistas amadores no país. Organizam apresentação de espetáculos para os moradores dos bairros, vão até as fábricas e recebem ainda grupos de outras partes do país que vêm apresentar peças teatrais e números de acrobacia, uma das atividades culturais muito apreciadas pelos chineses.





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