06/06/2023

Prostituição: novas formas, velha opressão.

Durante a pandemia de COVID-19 e com o isolamento social, vimos crescer exponencialmente a venda de imagens, vídeos e outras formas de conteúdo sexual online, atitude deliberadamente incentivada por algumas celebridades (que fortalecem e incentivam a imagem de que o Brasil é o país do sexo), mas não somente em sites “destinados a adultos”. Mesmo redes sociais como Instagram, Youtube, Twitter, Tinder e TikTok, com grande acesso do público infantil, funcionam de maneira a romantizar, estimular e propagandear estilos de vida que embelezam a prostituição e conduzem jovens mulheres a banalizarem a venda de imagens e vídeos de seu corpo em troca de dinheiro, “seguidores” e “curtidas”. Se propagandeia a ideia de que, por ser pelo meio virtual, e supostamente ser uma escolha da mulher de exercer sua “liberdade sexual”, não se caracteriza tais atitudes enquanto opressão e exploração fortalecendo, assim, a ilusão de “empoderamento feminino”.

Segundo a revolucionária Alexandra Kollontai, as origens da prostituição são sobretudo econômicas. Ela afirma que “a mulher é colocada, por um lado, em uma posição economicamente vulnerável e, por outro, ela é condicionada através de séculos de educação a esperar favores materiais de um homem em troca de favores sexuais, seja dentro ou fora dos laços do casamento”. (KOLLONTAI, 1921 em “A prostituição e as maneiras de combatê-la”).

Esse condicionamento secular, dentro do sistema capitalista, é reforçado de maneira que as mulheres, cada vez mais jovens, não vejam a prostituição como uma degradação de sua condição de ser humano, sobretudo as que praticam a prostituição virtualmente.

As redes sociais ainda reforçam essas ideias, moldando os comportamentos sociais da juventude, isto porque, o sistema de algoritmos impulsiona a padronização do comportamento humano, traçando o perfil de “consumo” dos indivíduos e apresentando para eles o que devem “consumir”, de maneiras sutis e invasivas. Ou seja, cada vez mais precocemente, crianças e adolescentes são bombardeados com conteúdos sexuais e são impulsionados a banalizar o seu consumo, estimulando o individualismo e o liberalismo nas relações.

Outra situação recorrentemente estimulada na juventude feminina é a “glamourização” e romantização da prostituição. Músicas, filmes, séries e “influencers” defendem a todo tempo que as meninas e mulheres, chamadas de “novinhas”, precisam relacionar-se com homens mais velhos e endinheirados, os “sugar daddy", para garantir o estilo de vida que são influenciadas a buscar. Muitos sites fazem propaganda abertamente de que se submeter a tal condição é uma excelente maneira das mulheres conquistarem sua “independência financeira”.

Imperialismo e a agonia da sociedade de classes

É chave ver como a crise do imperialismo, que se expressa como crise econômica, política e moral da velha ordem, afeta diretamente o aumento de casos de prostituição, sobretudo em países de capitalismo burocrático. Se a prostituição é uma escolha, por que então tal condição tem relação direta com o aumento da pobreza e da miséria? Por que as mulheres que sofrem com tal condição são majoritariamente negras, com baixa escolaridade, alijadas da prática social e da produção de diversas maneiras? É preciso que compreendamos que tal fenômeno tem relação direta com o processo de desindustrialização e reprimarização da economia da América Latina e de desproletarização da classe. As gerações mais novas se veem a margem do processo de produção e do emprego formal. Desta forma, há uma grande quantidade de pessoas lançadas à semiproletarização.

Há ainda a difusão crescente, inclusive nos currículos escolares, do empreendedorismo como meio de enriquecimento, que incute no imaginário destes jovens que a meta de vida é ter a garantia de conforto com pouco ou nenhum trabalho.

Apesar de toda ilusão liberal, é justamente nos momentos de aprofundamento da crise política, social, cultural e sobretudo econômica, que nota-se o aumento de casos de exploração sexual de crianças e mulheres. Essa é a condição brutal e degradante na qual principalmente as mulheres negras e pobres, no caso do Brasil, são lançadas a praticar e estimuladas a enxergar em tal prática um meio de vida para sobreviver.

Os dados sobre prostituição e tráfico humano para exploração sexual no Brasil e no mundo são escassos e subestimados e, ainda assim, estima-se que mais de 42 milhões de pessoas se prostituem no mundo, segundo dados de 2012. Destas, 75% são mulheres jovens entre 13 e 25 anos e 80% foram estupradas nesta condição. No Brasil cerca de 90% das pessoas que se prostituem não gostariam de se prostituir e estar nesta condição. Estima-se que sejam mais de 1,5 milhões de pessoas submetidas à prostituição, no Brasil, e, destas, 78% são mulheres; 59% das mulheres que se prostituem são chefes de família e o fazem para garantir o sustento dos filhos; 45% tem apenas o primeiro grau; 24,3% não concluíram o Ensino Médio e 70% das prostitutas não possuem uma profissionalização.  (dados do monopólio de imprensa BAND, no programa “A Liga” em 2010)

Segundo dados da ONU, o tráfico de pessoas para exploração sexual na indústria pornográfica e mesmo na prostituição movimenta mais de 9 bilhões de dólares no mundo por ano, perdendo somente para a indústria bélica e para o tráfico de drogas. Estima-se que na Ásia, o total de pessoas traficadas e exploradas sexualmente representa 56% das vítimas traficadas no mundo inteiro. Segundo dados da UNICEF, em 2010, estimava-se que mais de 250 mil crianças foram submetidas à exploração sexual no Brasil e, no mundo, estima-se que sejam cerca de 2 milhões de crianças. Apesar dos altos índices, os dados sobre turismo sexual não dão conta de abranger a real quantidade de pessoas submetidas à essa exploração, sobretudo nos megaeventos como Copa e Olimpíadas, e sabe-se que os estados brasileiros mais pobres também são os com maiores índices de exploração sexual, sobretudo no que se compreende na faixa norte-nordeste.

A posição das revisionistas e oportunistas

Algumas feministas burguesas ou pequeno burguesas defendem a regulamentação da prostituição, como se tal medida garantisse melhores condições para as prostitutas, propõem isso porque não tem nada em seus programas reformistas que possa pôr fim a exploração sexual. Com isso confundem as mulheres do povo e cumprem seu vil papel de auxiliares do imperialismo e da reação.

O que a regulamentação propõe, na realidade, é estabilizar um fenômeno social grave, que surge quando mulheres se encontram em uma condição vulnerável. Tais feministas pensam que a exploração sexual feminina se torna aceitável, desde que cumpra o regulamento estabelecido. É chave desmascarar qualquer idealização sobre isso! Vejamos a situação em países europeus e de primeiro mundo onde a legalização da prostituição está diretamente vinculada com o tráfico de mulheres de países oprimidos. Isto porque enquanto há uma queda de mulheres nativas se prostituindo, há um aumento de imigrantes que são traficadas, iludidas com falsas propostas de trabalho e submetidas à exploração sexual.

Por outro lado, há o segmento mais radical do feminismo burguês e pequeno burguês que defende o tal “modelo nórdico”, que proíbe a prostituição e alimenta a lógica punitivista para os “clientes”, como se tal medida fosse resolver o problema da mulher que se encontra em tal situação.

Combater os exploradores e as causas da prostituição!

Não é incomum ouvir-se dizer que a prostituição é a “profissão mais antiga do mundo”. Porém, o que essa afirmação esconde é que tão antigo quanto a prostituição é a opressão feminina, pois ambas surgem em um momento particular na história da humanidade, que é o surgimento do patriarcado, da propriedade privada e da sociedade de classes, em que a condição da mulher na sociedade foi sendo crescentemente degradada.

A prostituição não pode ser considerada profissão, pois não se trata da venda da força de trabalho, mas do próprio corpo humano. Não produz nada socialmente e o lucro obtido com a exploração se dá por meio da venda do corpo das mulheres.

O trabalhador, despossuído dos meios de produção, vende ao patrão a sua força de trabalho, não a si mesmo. Esta é uma das condições que permite diferenciar o proletariado dos escravos. Ao prostituir-se, a mulher vende seu próprio corpo, assemelhando-se à condição dos escravos por seu corpo ser propriedade de outrem e decai em uma condição que a torna em coisa, desumanizando-a.

Há ainda o peso da moral burguesa hipócrita, piorando mais ainda a situação da mulher a burguesia repudia à prostituição somente em palavras e no sentido de criminalizar a mulher prostituída, mas não a ordem de exploração e opressão que a permite estar nesta condição. Engels, analisando a formação da composição familiar monogâmica, percebe como, por um lado, instituiu-se a monogamia para as mulheres e, por outro, perpetuaram as condições de liberdade sexual para os homens. Vejamos:

O heterismo [poligamia] é uma instituição social como outra qualquer, e mantém a antiga liberdade sexual...em proveito dos homens. Embora seja, de fato, não apenas tolerado, mas praticado livremente sobretudo pelas classes dominantes, ele é condenado em palavras. E essa reprovação, na realidade, nunca se dirige contra os homens que o praticam e sim, somente, contra as mulheres, que são desprezadas e repudiadas, para que se proclame uma vez mais, como lei fundamental da sociedade, a supremacia absoluta do homem sobre o sexo feminino.” (ENGELS, 1884, A origem da família, da propriedade privada e do Estado).

Para as mulheres do povo não basta compreender e denunciar o problema social e econômico que gera a prostituição e suas consequências. É preciso tomar parte ativa na luta pela emancipação feminina como parte intrínseca da luta pela emancipação da classe. Combater a moral burguesa e o revisionismo, pois a exploração sexual não será erradicada com o mero punitivismo ou com reformas liberais como a regulamentação da prostituição. A exploração sexual será erradicada na medida que a luta contra o sistema de exploração e opressão do capital avance, de forma organizada e com a elevação da consciência da classe em meio a luta pela emancipação feminina. Devemos instigar, sobretudo na juventude, o combate sem quartel a naturalização da prostituição, incentivar uma nova cultura, a moral proletária e a participação ativa na luta de classes.





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