28/08/2023

Dona Alzira, líder histórica das vítimas de Santa Elina

No início de 2013, Dona Alzira morreu. Ela lutou na heroica Batalha de Santa Elina e transformou-se em uma liderança histórica da luta das vítimas de Corumbiara. Camponesa, percorreu todas as regiões do Brasil, trabalhando na roça e em outros ofícios, sempre com o sonho de um pedacinho de terra. Ela foi uma das fundadoras do Codevise – Comitê de Defesa das Vítimas de Santa Elina e mesmo com problemas de saúde, era a mais ativa mobilizadora da luta pela indenização e tratamento de saúde para as vítimas na região de Palmares D’Oeste, no município de Theobroma. Estava sempre acompanhada do grande companheiro Seu João, com quem foi casada por 30 anos.

Dona Alzira Augusto Monteiro, nasceu dia 2 de agosto de 1951, em Caravelas, na Bahia. Mas foi em Nanuque, Minas Gerais, que viveu boa parte da infância. Em Goiânia, passou sua juventude e em 1976 teve seu primeiro e único filho, Wellington. Depois morou no Pará, onde trabalhou como professora primária e casou-se com Seu João, a quem Wellington adotou como pai.

Entre 1983 e 1984, Dona Alzira e sua família vieram para Corumbiara, Rondônia. Trabalharam como arrendatários numa média propriedade. Ela também foi zeladora na Escola Municipal na área Vitória da União. Até que em 1995 ingressaram na tomada da fazenda Santa Elina. Foi o início da conquista do sonho de um pedaço de terra para a família trabalhar e viver com dignidade.

Mas é preciso lutar para transformar os sonhos em realidade. E Dona Alzira lutou na Batalha de Santa Elina. Também conhecido como Massacre de Corumbiara, na verdade foi uma das mais importantes lutas camponesas de nossa época, que deixou claro a essência das duas classes em disputa. De um lado, o latifundiário Antenor Duarte, explorador, covarde, assassino, torturador. Do outro, 600 famílias de camponeses pobres, trabalhadores, justos, honestos, bravos lutadores. Lá, Dona Alzira machucou a perna. Esta ferida, aliada a outros problemas de saúde, a acompanharam o resto da vida e tragicamente culminaram em sua morte. Ela também viu companheiros serem humilhados, torturados e assassinados, inclusive a pequena Vanessa de apenas sete anos de idade.

Mas a preparação do acampamento e a luta heroica e destemida contra o latifúndio, numa das regiões em que ele é mais sanguinário, apontou o caminho dos camponeses em todo o Brasil. As famílias de Santa Elina finalmente conquistaram suas terras, mas em outros locais, pois naquele momento não conseguiram cortar a fazenda regada com sangue camponês. Esta conta foi acertada pelos camponeses 16 anos depois com a retomada da fazenda Santa Elina e o Corte Popular, organizado pela LCP e o CODEVISE.

Em 1996, Dona Alzira, Seu João e Wellington, mais conhecido como Coca, foram então morar em seu lote no assentamento Rio Branco, município de Theobroma. Viveram e trabalharam a terra vários anos, mas devido a saúde frágil, ela e Seu João não conseguiam tocar mais o lote e se viram obrigados a se desfazerem dele. Mas foram morar pertinho, na Vila Palmares. (…)

Também, as vítimas de Santa Elina não deixariam Dona Alzira e Seu João mudarem-se pra longe. A casa deles estava sempre cheia de camponeses e lideranças da luta debatendo, trocando informações. Sempre tinha comida, banho e pouso para quem precisasse.

Dona Alzira lutava fortemente por seus ideais, tinha grandes sonhos de uma vida melhor para todo o povo. Ela não desanimava com os percalços que a vida apresenta. Mesmo com vários problemas de saúde, seu semblante era sempre alegre, animando seus companheiros. Em 2007, durante um ato de celebração do 8 de março – Dia Internacional da Mulher Trabalhadora, o MFP – Movimento Feminino Popular homenageou Dona Alzira e outras 3 camponesas, líderes da luta pela terra.

Como a maioria do povo brasileiro, Dona Alzira morreu vítima da exploração. Mesmo trabalhando duro a vida inteira não conseguiu tratar da saúde antes de se agravar. Ela esteve duas vezes em Belo Horizonte para fazer tratamento médico no Socorro Popular. Numa das vezes, ficou 6 meses, e melhorou bastante. Mas voltando pra Rondônia não conseguiu manter o tratamento, devido à péssima assistência médica.

Inesperadamente, na manhã do dia 5 de janeiro, rompeu uma veia da ferida de sua perna. Seu filho que estava com ela, chamou socorro, mas ela morreu em seus braços, em casa, aos 62 anos de idade.

O companheiro Coca, disse: “Se o governo tivesse cumprido o que prometeu e desse pelo menos a assistência médica às vítimas, minha mãe e outros companheiros poderiam estar vivos ainda. O Lula esteve lá no acampamento em Santa Elina em 1995 prometendo.” (…)

Dona Alzira ficará sempre em nossa memória e coração como a matriarca da luta, grande mobilizadora, que deixou seu nome na luta popular organizada. Devemos nos mirar no exemplo de vida e trabalho, luta, companheirismo e otimismo. É a melhor forma de homenagearmos a companheira Alzira.

 

Companheira Alzira, presente na luta!


LCP de Rondônia e Amazônia Ocidental | 6 de abril de 2013

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