26/03/2019

Cartilha - Cadeia para os torturadores e criminosos do regime militar!



Publicamos a seguir cartilha elaborada pelo MFP em 2011 para campanha que levantamos na ocasião pela punição para os criminosos, civis e militares, mandantes e executores de torturas, assassinatos e desaparecimentos forçados do regime militar de 1964-1985. A cartilha foi amplamente utilizada nos núcleos do movimento como formação política e impulsionou dezenas de manifestações, debates, denúncias e atividades de propaganda.


Cadeia para os torturadores e criminosos do regime militar!



I – Apresentação





O MFP – Movimento Feminino Popular está levantando uma importante campanha pela punição dos criminosos – mandantes e executores de torturas, assassinatos e desaparecimentos forçados – do Regime Militar, somando forças com os familiares e organizações que nunca desistiram dessa causa. Para que possamos defender esta causa com um maior entendimento por todas as companheiras escrevemos esta cartilha. Essa luta, além do mais, serve à elevação da consciência política de todo nosso povo.

Este é um problema que afeta terrivelmente não só o passado de centenas e até milhares de pessoas no Brasil, mas o presente e o futuro de todo nosso povo. Com esta Cartilha vamos demonstrar isto e contribuir para levantar um grande movimento nacional pela punição dos criminosos do Regime Militar. Para isto a cartilha deve ser utilizada como material de estudo constante e também de propaganda do movimento.

Desde o início desta luta, as mulheres tiveram papel decisivo na mobilização e pela pressão tiveram importantes conquistas. Nosso dever é encampar esta luta do povo brasileiro, e que faz parte da luta por justiça, democracia e pela transformação de nossa sociedade.

Para fazer uma exposição esclarecedora sobre a questão é necessário remontar à história recente do país, do processo político nacional marcado por regimes fascistas, à luta de nosso povo por uma verdadeira democracia. Apesar de toda riqueza natural que possui e de uma certa industrialização, o Brasil segue sendo um país atrasado cuja imensa maioria da população é muito pobre frente uma brutal concentração de renda por uma ínfima minoria. As crises econômicas são crônicas com desemprego massivo, salários arrochados e os sistemas públicos de saúde e educação extremamente precários. Tudo isto tem uma base e causa histórica da dominação estrangeira secular. A dominação imperialista segue subjugando a Nação e espoliando o povo, mantendo o país na condição semicolonial e semifeudal. Este sistema em que uma grande burguesia unida ao latifúndio a serviço da dominação imperialista determina a natureza do Estado e a situação geral da sociedade.




II – O Estado Brasileiro



O Estado brasileiro é um velho Estado semifeudal e semicolonial de grandes burgueses e latifundiários, serviçais do imperialismo. O que isto quer dizer? Quer dizer que este Estado ao longo dos séculos se estruturou como instrumento das classes exploradoras (grandes burgueses e latifundiários) e do imperialismo para dominação e opressão do povo e de subjugação da Nação Brasileira. Por isto mesmo nossa nação não é independente, não há autonomia política, econômica e cultural no nosso país. E os governos não passam de meros gerenciamentos de turno, que se revezam seguindo estritamente as orientações das potências estrangeiras exploradoras de nossa pátria.

O povo brasileiro, ao contrário do que se difunde, sempre se rebelou contra todo tipo de exploração, dominação e opressão. É por isto que a estrutura principal do Estado são as forças armadas que garantem sob a ponta de fuzis os mandos e desmandos das classes dominantes.

Muitas lutas e rebeliões populares e democráticas contra o latifúndio, a miséria, a pobreza, e pela emancipação da pátria ocorreram ao longo de séculos, a maioria delas foram sufocadas pelas forças repressivas do Estado, através da guerra, tortura e matanças de milhares de massas trabalhadoras e de suas lideranças.

Por causa das crises crônicas na economia e na política e das revoltas populares, muitas vezes as classes dominantes, para reestruturar o poder de Estado, mudaram a forma de governo, porém nenhuma dessas mudanças alterou a essência deste Estado.

No último século, por exemplo, transitou-se de regimes fascistas declarados como o “Estado Novo” de 1937 a 1945 com Getúlio Vargas e o Regime Militar de 1964 a 1985, para as chamadas “democracias”, em que o processo eleitoral é usado para iludir o povo de que seria representado nos cargos de poder, passando a falsa idéia de que o povo escolhe as leis, a política e os governantes do país.

O fato é que este velho Estado nunca representou todo o povo como insistem os donos do poder, os oportunistas e demagogos. Ele representa diretamente e somente os interesses da grande burguesia, do latifúndio e do imperialismo, os quais são opostos aos interesses do povo e da nação brasileira.





III – O Regime militar de 1964: necessidade da dominação imperialista



Para que possamos entender o que representa a luta pela punição dos criminosos do Regime Militar – mandantes e executores de torturas, assassinatos e desaparecimentos forçados – que durou mais de 20 anos (1964 a 1985) é necessário passar por uma breve retrospectiva dos acontecimentos, da luta das massas, da crise existente no país à época e de como se estruturaram as classes dominantes para garantir o seu poder a ferro e fogo.

Muitos denominam este período como “ditadura militar”, mas consideramos a denominação “regime militar” mais correta e científica, pois como apresentamos mais acima, desde a sua formação o Estado brasileiro sempre foi uma ditadura contra o povo e democracia para as classes dominantes exploradoras. O regime militar foi uma das diferentes formas que esta ditadura adquiriu.

O regime instalado com o golpe militar-civil foi uma necessidade para o imperialismo barrar as ameaças de perder o controle sobre o país, de suas fontes de matérias primas, das riquezas minerais e florestais, da exploração de força de trabalho barata e do mercado cativo para as mercadorias de suas empresas monopolistas. Para assegurar este controle insuflaram, orientaram e apoiaram o regime dos “gorilas” que atacou a todos opositores, impondo por mais de 20 anos sobre o país, a nação e o povo, um regime de terror, perseguições, prisões, torturas, assassinatos e desaparecimentos forçados.



III.1- Antecedentes



Os anos de 1960 se iniciaram com uma efervescência de todo o movimento popular no Brasil. Ainda na década de 1950 aconteceram as lutas camponesas de Porecatu no Paraná e de Trombas e Formoso em Goiás. Nelas, os camponeses posseiros resistiram em suas terras de armas nas mãos contra grileiros (grandes fazendeiros que forjavam falsas escrituras de terras), seus pistoleiros e as forças policiais, saindo vitoriosos da luta. O movimento camponês se organizava através das Ligas Camponesas e principalmente no nordeste foi muito forte. A questão da terra nunca resolvida no país ganhava, cada vez mais, uma repercussão política e ameaçava o poder dos latifundiários e, por decorrência ameaçava a dominação da grande burguesia e do imperialismo.

Em 1963 o presidente da república Jânio Quadros renuncia e assume o seu vice João Goulart com um discurso nacionalista, declarando compromisso perante o povo de atender suas reivindicações das chamadas “reformas de base”, como a Reforma Agrária, Reforma Urbana e a Reforma Universitária. O discurso de João Goulart não agradava os setores mais reacionários do Estado, que viam com grande ameaça a possibilidade do povo se fortalecer e fazer uma revolução no país.

Neste período estavam acontecendo processos revolucionários no mundo inteiro, em que o povo mudava seu destino. 1/3 da população mundial estava sob o regime dos operários e camponeses, com o Socialismo e as Democracias Populares. A imprensa dos exploradores, as agências do imperialismo e as igrejas faziam alarido sobre uma suposta “ameaça do comunismo” para aterrorizar a classe média e o povo desinformado.

Os grupos de poder mais ligados ao imperialismo no Brasil passaram a mobilizar setores da sociedade para justificar a implantação de um regime fascista. Altos burocratas, industriais, banqueiros, latifundiários passaram a instigar a crise econômica para desestabilizar o governo de João Goulart, enquanto o clero usava as missas e cultos religiosos para amedrontar as pessoas. Dias antes do Golpe aconteceu a “Marcha com Deus pela família e pela liberdade” organizada juntamente com as altas cúpulas da igreja católica. Exigiam mão pesada do Estado para conter os movimentos populares e contra a implantação do “comunismo” no Brasil. Assim, com a classe média assustada, o golpe de Estado parecia se justificar colocando o alto comando militar para governar diretamente o País. Imediatamente lançaram todo tipo de atrocidades contra o povo e suas lideranças, na tentativa de liquidar qualquer mobilização e organização popular.



III.2 – O Golpe



Em 1º de abril de 1964, o que eram rumores, passou a se efetivar enquanto um golpe de Estado organizado em todo o país. O General Humberto de Alencar Castello Branco passou a exercer o poder político com a deposição do presidente João Goulart. A alta cúpula das forças armadas passou a ter poderes de cassar mandatos de deputados, governadores. Através dos chamados Atos Institucionais os sucessivos generais no poder legalizaram todo o tipo de arbitrariedades e crimes. Os partidos políticos foram extintos sendo permitidos somente a Arena e o MDB. O Congresso Nacional foi dissolvido e reaberto como farsa para manter a aparência de democracia, onde quem não dissesse amém ao general de plantão tinha seu mandato fatalmente cassado, perseguido, preso, torturado e mesmo assassinado como foi o caso do deputado Rubens Paiva.Todas as eleições passaram a ser indiretas e interventores eram designados para assumir todos os cargos executivos.

Mas todas estas medidas tinham o objetivo principal de atingir as organizações populares. Diversas lideranças populares que haviam se destacado nas mobilizações no período anterior foram presas. A UNE, o CGT e organizações democráticas foram colocadas na ilegalidade. As Ligas Camponesas foram perseguidas destruídas. Fazer greve era ilegal e os sindicatos que tinham direções combativas sofreram a intervenção do Ministério do Trabalho. Era proibido qualquer tipo de manifestação contra o regime. As pessoas foram proibidas de se organizar politicamente.

A imprensa foi censurada, não era permitida nenhuma publicação que criticasse os militares ou seu regime. Muitos jornalistas foram perseguidos, jornais e revistas fechados e publicações proibidas. Artistas também foram perseguidos, manifestações culturais democráticas foram censuradas.

Um Estado de Sítio permanente foi instaurado de forma que as pessoas não tinham o menor direito de exercer seus direitos de cidadãos e qualquer rumor de descontentamento era considerado crime contra o Estado. Prisões e torturas passaram a ser rotineiras e execuções sumárias eram justificadas como “troca de tiros de terroristas com agentes de segurança do Estado”. O chamado “estabelecimento da ordem” foi criado sob uma verdadeira atmosfera de terror.

As condições de vida do povo não melhoraram, pelo contrário, um terrível arrocho salarial atingia todos trabalhadores que ainda tiveram pisoteados direitos duramente conquistados. As transnacionais (empresas estrangeiras multinacionais) tomaram de assalto e de vez a economia nacional. As condições de trabalho pioravam a cada dia, enquanto os lucros dos imperialistas iam até as alturas.

                                   



III.3- A resistência ao regime e as organizações Revolucionárias



É claro que tudo isto não aconteceu sem muita resistência popular. Mesmo na ilegalidade e clandestinidade, sindicatos, organizações estudantis e demais organizações sindicais e políticas continuaram a se organizar e protestar.

Com crimes políticos horrendos e tamanha brutalidade cresceu a contestação contra o regime. Parte da classe média que antes tinha apoiado o golpe militar tomava consciência do erro que havia cometido, começava a se manifestar contra, com manifestações e protestos públicos. Congressos e reuniões eram organizados secretamente. Partidos revolucionários se dedicavam à propaganda contra o regime e por uma revolução para livrar o país da “ditadura”.

Em 1968 aconteceu uma importante manifestação estudantil no Rio de Janeiro. O assassinato do Estudante Edson Luis no restaurante calabouço causou comoção muito grande e uma manifestação de mais de 100 mil pessoas foi realizada com a bandeira política contra o regime dos militares.

Mas a resistência principal ao regime foi realizada através da luta armada na cidade e no campo. Valorosos brasileiros, homens e mulheres, jovens e maduros, lançaram-se numa luta desigual contra o fascismo. Estudantes, professores, operários e camponeses se dedicaram a organizar a luta revolucionária no país. Guerrilhas foram realizadas na cidade e no campo. A mais importante delas foi a Guerrilha do Araguaia que aconteceu no sul do Pará, dirigida pelo Partido Comunista do Brasil, entre 1972 e 1974. Na época o Partido Comunista do Brasil estava se reconstruindo com uma linha revolucionária da Guerra Popular, no objetivo de tomar o poder para o povo no Brasil. Foram necessárias 3 expedições das forças armadas para derrotar a guerrilha. Foram muitos os heróis e heroínas do nosso povo neste período que entregaram generosamente suas vidas, acreditando num futuro de democracia, liberdade e prosperidade para as próximas gerações.

Toda a luta de resistência ao regime militar-fascista teve uma importância muito grande, pois demonstrou que nenhuma força, mesmo armada até os dentes pode derrotar o povo e que, após cada batalha perdida o povo recomeçaria tudo de novo corrigindo os erros até triunfar um dia. Toda a resistência semeou esperança e por menores que fossem atingiram vitórias importantes.



III.4 – Tortura, assassinatos e desaparecimentos forçados



                                                Durante os anos de Regime Militar todo tipo de aparato de terror foi montado. Para se informarem sobre as organizações opostas ao regime, os militares montaram o SNI-Serviço Nacional de Informações e recrutaram centenas de milhares de funcionários públicos para espionar todas as pessoas por todas as partes do país. Orientados pelas agências do governo norte-americanos instalaram nos quartéis verdadeiros centros de tortura. Nestes porões eram usados equipamentos para aplicação de choques elétricos em várias partes do corpo, afogamentos, pau-de-arara, porretes entre muitos outros. As prisioneiras sofreram toda sorte de abusos e humilhações, foram estupradas e, como vários prisioneiros, tiveram órgãos decepados. Pais e mães sofriam estes abusos e crueldades na frente de seus filhos ou eram obrigados assistir torturas de companheiros e entes queridos. Todo o tipo de barbaridade de lesa humanidade foi perpetrado por esses sanguinários.

Os piores crimes contra o povo e a humanidade foram cometidos pelos generais e seus comandados das forças armadas e forças policiais brasileiras. Estruturaram um esquema de operações de prisões, torturas e aniquilamento daqueles que contestavam seu poder. Muitas famílias perderam seus filhos e filhas, maridos e esposas numa perseguição feroz. Mesmo na obrigatória clandestinidade desde o estabelecimento do regime, muitos revolucionários foram presos e torturados, muitos torturados até a morte e centenas desaparecidos até os dias de hoje.

Como sabiam que toda esta barbaridade não seria aceita, não admitiam que faziam tais atrocidades. Tudo veio à tona através da denúncia de pessoas que foram presas, torturadas ou presenciaram a tortura de seus companheiros na prisão.

Para justificar tamanha atrocidade, muitas vezes ao declarar a morte de algum perseguido político, simulavam que havia acontecido um “tiroteio”, mesmo que nas fotos registradas houvessem marcas de tortura e assassinato. Mas muitas mortes eles não podiam declarar. Praticaram corriqueiramente ocultação de cadáveres, com cemitérios clandestinos. Muitos deles até hoje continuam com sua localização oculta.

Os opositores ao regime que decidiam lutar, os revolucionários, eram presos, condenados, torturados e executados sem nenhum direito de defesa, sem nenhum tribunal em que pudessem declarar os seus pensamentos.

Exemplo de como a ocultação de cadáveres era clara orientação destes facínoras foram os acontecimentos na região do Araguaia no sul do Pará, onde os mais de 62 guerrilheiros do Partido Comunista, em sua quase totalidade ainda hoje continuam declarados como “desaparecidos”. Tudo isto mesmo com relatos e declarações de moradores da região que testemunharam a tortura e assassinados praticadas pelos militares.

 Muitos relatos e denúncias seguiam no boca a boca e pela imprensa clandestina. Quanto mais público isto se tornava, mais ódio despertava no povo e em consequência, a mobilização contra o regime militar.

É importante destacar como toda prática desenvolvida pelo regime militar era apoiada e orientada pelo EUA. Os golpes militares foram uma política orientada para toda a América Latina. Países como Argentina, Chile e Uruguai também passaram por processos bastante semelhantes. Havia uma conexão entre os comandos dos exércitos de vários países, com a orientação do EUA. Existiam escolas de treinamento de torturas, como a chamada “escola das Américas”, onde os militares brasileiros tiveram uma grande importância, para o treinamento de torturadores por todo o continente.





IV – A luta pela liberdade dos Presos Políticos e a Campanha pela “Anistia”[1]



IV.1 – O movimento de massas em geral



No final da década de 1970, o desgaste do regime militar  já era acentuado, as denúncias contras seus crimes e a corrupção por um lado e a crise econômica e os clamores por democracia por outro, não paravam de crescer. O Movimento Popular tomou novo impulso, greves combativas passaram a acontecer mesmo sendo ilegais. O Movimento Estudantil também ressurgia combativo e desafiando o regime cada dia mais antipatizado pelo povo.

A opinião publica em geral passava a contestar de forma mais aberta o regime dos militares. Em todo esse período, muitos lutadores estavam ameaçados e tinham que se refugiar no exterior ou seguir vivendo na clandestinidade dentro do próprio país, sempre com o risco de serem presos pelo “crime” de ser contra o regime militar.



IV.2- O movimento de mulheres



No seio do Movimento Popular se acirrava a luta política sobre como dar fim ao regime militar-fascista. Os oportunistas clamavam por um acordo com os militares e pediam uma anistia para os presos políticos e todos os perseguidos. Os revolucionários defendiam a derrubada completa do regime e a instalação de um governo democrático popular e exigiam a imediata liberdade de todos os presos políticos. Em 1975, em meio a esta luta, um grupo de mulheres de classe média, lideradas por Tereza Zerbini, e baseadas mais em sentimentos humanitários, tomaram a iniciativa de levantar a campanha pela Anistia. Assim surgiu o Movimento Feminino Pela Anistia. Este Movimento, apesar da visão ingênua teve o mérito de levantar uma campanha pela soltura dos presos políticos e anulação de todos os processos e perseguições por motivo político. Embora seu conteúdo fosse reformista e não tocava na necessidade de liquidar com toda a estrutura que deu suporte ao regime militar-fascista, ajudou muito em levantar um clamou nacional pela liberdade e pela democracia. Logo o movimento pela Anistia ganharia mais força com a integração das organizações revolucionária, porém seguia com ilusões reformistas e se tornaria um movimento de massas no país.

O programa da luta pela Anistia consistia em:

- Erradicação da tortura;

- Esclarecimento das circunstâncias dos crimes do regime militar;

- Localização dos restos mortais dos desaparecidos políticos;

- A nomeação, responsabilização e punição dos torturadores e assassinos de presos políticos e os que continuassem a praticá-los.

A palavra de ordem era: “PELA ANISTIA AMPLA, GERAL E IRRESTRITA”. Ampla e geral porque deveria atingir todos os perseguidos pelo regime militar, fossem eles presos no país, exilados, servidores públicos, sindicalista e etc. Irrestrita porque deveria significar um verdadeiro fim às perseguições políticas sendo garantido o fim do terrorismo de Estado.



IV.3 – A Lei da Anistia de 1979



Apesar da grande mobilização, os gorilas tendo à frente o general Figueiredo como tirano de plantão e contando com a ação dos oportunistas, habilmente conseguiram distorcer as reivindicações do movimento popular e pactuaram no Congresso nacional sob a denominação de “Lei da Anistia Ampla Geral e Irrestrita”, um texto cheio de brechas e lacunas que favoreciam a interpretação de conciliação nacional e de virada de página da história. O que deveria ser uma anistia para os perseguidos pelo regime, passou a ser uma anistia que preventivamente impedia que os criminosos mandantes e praticantes de tortura, assassinatos e desaparecimentos políticos pudessem ser processados e julgados pelos crimes hediondos que cometeram. 





V – “Redemocratização”, a nova farsa



Devido a forte pressão popular o desgaste do regime militar só aumentava. Ainda em fins de 1970 os planos das classes dominantes mudavam. Já haviam desestruturado bastante as organizações revolucionárias assassinando seus principais dirigentes. Ou seja, com a eliminação dos revolucionários mais firmes e mais preparados, as posições ideológicas mais avançadas, revolucionárias de fato, perderam força seio do movimento popular, que acabou mais uma vez arrastado para as posições reformistas e oportunistas. Foi o que ocorreu com toda ilusão eleitoreira da democracia burguesa em que a imensa maioria das organizações denominadas por esquerda e comunista do país se enveredaram.



 Era necessário dar uma cara nova para o Estado, transitando de um regime fascista declarado para um regime civil em que houvesse eleições para os cargos legislativos e de governo, com bastante maquiagem, simulando uma democracia. Desde a transição do General Geisel para o general Figueiredo como presidente, já haviam acordos sobre os planos de como se daria esta transição.

Desde o gerenciamento de Geisel que havia uma luta no meio dos militares, entre os que não aceitavam ceder nada e manter o regime com os que defendiam não ser mais possível mantê-lo, que era necessário fazer uma transição “lenta, gradual e segura”, antes que rebeliões populares derrubassem o regime, abrindo caminho para mudanças mais profundas. Após lutas intestinas, com que os grupos militares mais extremados realizaram atentados terroristas contra democratas e assassinaram militantes que não estavam na luta armada e que, inclusive eram contra a luta armada, tal como os assassinatos do jornalista Vladimir Herzog e do operário Manuel Fiel Filho na prisão, o que só aumentou o clamor contra o regime moribundo e que com a chegada das eleições para o Colégio Eleitoral, viu desatar-se as torrentes de manifestação pelas eleições diretas para presidente do país.

Houveram grandes manifestações por eleições diretas para governadores e para presidente da república, e apesar do primeiro governo civil ter se dado com a eleição indireta de Tancredo Neves em 1984, somente em 1988 aconteceram as primeiras eleições diretas. A transição segura estava feita, com a dura realidade de que os mesmos carrascos do regime militar continuarem livres e dentro dos aparatos do Estado. Mudaram a fachada para esconder as estruturas podres do Estado que continuou servindo aos interesses do latifúndio, da grande burguesia e do imperialismo.



VI – O debate da “Lei de Anistia” no momento atual



Durante todos os anos que se seguiram, os familiares dos assassinados e desaparecidos pelo regime militar-fascista continuaram as buscas dos restos mortais ou paradeiro de seus filhos e filhas, mães e pais, esposas e maridos, irmãos e irmãs. Descobriram ossadas, cemitérios clandestinos, tudo isto sem nenhuma ajuda de qualquer governo. Nenhum dos gerenciamentos civis, posteriores ao regime militar, tiveram interesse de sequer tentar amenizar as dores dessas famílias, muito menos de apurar os crimes, formalizar culpa, julgar e condenar os responsáveis, mandantes e executores, militares e civis, tal como grandes empresários que desempenharam papel primordial no regime e passaram ilesos até os dias atuais.

Mas há os que continuam resistindo e lutando pela punição dos crimes cometidos pelo regime de 1964 a 1985. Muitos esperaram que o gerenciamento do PT- Luís Inácio/Dilma faria esforço para resgatar a história e punir os velhos carrascos.



Vejamos as medidas promovidas por este gerenciamento:

- Impedimento da abertura de arquivos secretos dos militares, que facilitariam as buscas pelos restos mortais pelos familiares dos desaparecidos políticos e todos os interessados em revelar a verdade na Hitória;

- Negação da decisão do Tribunal Interamericano de Direitos Humanos, do qual o Brasil faz parte e que julgou o Estado Brasileiro como responsável pelos crimes de tortura, execução sumária e ocultação de cadáveres no caso da Guerrilha do Araguaia (1972/1974), o que o obrigaria a apurar os fatos e condenar os militares envolvidos.

- Elaboração de um “novo” PNDH (Plano Nacional de Direitos Humanos) que reafirma os mesmos mandamentos da Lei da Anistia de 1979, protegendo os militares.

- Formação de uma “comissão da verdade”, formada por militares e membros do governo que terão 2 anos para “esclarecer” os fatos. Na verdade comissão da mentira, para tentar tapear mais uma vez e jogar para debaixo do tapete a verdade histórica, protegendo os facínoras que promoveram as torturas, os assassinatos e os desaparecimentos forçados.

Não há interesse de nenhum desses gerenciamentos em esclarecer nada, pois eles representam, como grupos de poder, as classes reacionárias que comandam o velho Estado cujos agentes têm as mãos cheias de sangue neste capítulo negro de nossa historia.



VI – A necessidade da punição dos torturadores e seu significado histórico



A luta pela punição dos criminosos, mandantes e executores de torturas, assassinatos e desaparecimentos forçados, não tem tempo para acabar. Pensar que esquecemos a história é um grande engano. Esta não pode ser apagada. O sangue dos lutadores do povo rega a luta nos dias atuais. Condenar seus torturadores e algozes é prestar contas históricas e continuar a causa pela democracia nova. Não nos levantar nesta luta ou aceitar passivamente as ordens deste Estado é ser conivente com a continuidade destas barbáries que seguem existindo nos dias atuais. Torturadores e assassinos, bem como seus mandantes, vivem a solta por aí, como se fossem pessoas de bem, enquanto os aparatos de perseguição e tortura contra o povo pobre só tem se sofisticado e novas políticas repressivas, presididas por renegados como Dilma, Genoíno entre outros, seguem operando e massacrando o povo pobre nas vilas, favelas, nos campos e praticamente em todos presídios e delegacias do país.



A compreensão e colocação sintética da questão:



A correta compreensão deste problema e o justo enfoque de sua resolução deve partir de que um ajuste de contas do povo com seus algozes, como ficou demonstrado na experiência histórica das revoluções proletárias, só pode ocorrer com a vitória da revolução e destruição do velho Estado genocida das classes dominantes e estabelecimento do novo Estado popular. Neste sentido, no estágio atual da nossa luta devemos afirmar frente aos crimes do regime militar e todos os demais do velho Estado brasileiro a seguinte síntese: Nem perdão, nem esquecimento e nem reconciliação: punição para os criminosos do regime militar, civis e militares, mandantes e executores, de torturas, assassinatos e desaparecimento forçados.



Fundamentação e justificativa da necessidade da punição



1- O terrorismo de Estado é a forma da contrarrevolução atacar a luta revolucionária e democrática do povo pela sua libertação e pela conquista de uma nova sociedade sem exploração e sem opressão. A prisão, a tortura, o assassinato e o desaparecimento forçado são as formas do terrorismo de Estado com que a contrarrevolução do velho Estado reacionário e genocida combate o povo, suas organizações de massas e culturais e sua vanguarda organizada.



2- Juridicamente a Lei de Anistia passa por cima dos preceitos do senso comum estabelecido nos estatutos e convenções internacionais, segundo os quais os crimes de tortura e desaparecimento forçado são imprescritíveis. Portanto,  há que revogar tal lei que impede a apuração, identificação, acusação, processo e condenação dos crimes tipificados.



3- Do ponto de vista moral e cultural as classes dominantes buscam legitimar a situação de que, toda vez que o movimento popular em ascensão ameaçar a estabilidade do seu sistema de exploração, poderão lançar mão do fascismo aberto para debelar a ameaça e retornar à “estabilidade” com leis semelhantes para a “reconciliação nacional”.








[1]              Anistia Ato do poder público que declara impuníveis delitos praticados até determinada data por motivos políticos ou penais, ao mesmo tempo que anula condenações e suspende diligências persecutórias. (Dicionário Houaiss).

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Punição para os criminosos, civis e militares, mandantes e executores de torturas, assassinatos e desaparecimentos forçados do regime militar








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