24/04/2023

Dinalva Oliveira (Dina)

De origem pobre, Dinalva Oliveira, filha de Elza Conceição Bastos e Viriato Augusto de Oliveira nasceu no distrito de Argoim, no município de Castro Alves, 190 quilômetros de Salvador, em 16 de maio de 1945. Aquela que décadas depois seria conhecida por Dina do Araguaia, e se tornaria subcomandante do Destacamento C, teve uma infância simples e viveu as dificuldades da vida no campo desde cedo.

Carinhosamente chamada de Naná, mudou-se para Salvador com sua família em busca de melhores condições de vida, pois tal como hoje os rincões de nosso país reservavam ao seu povo uma vida dura e de poucas oportunidades.

Chegou a Salvador após concluir o primário e passou a estudar no Instituto Central de Educação Isaías Alves, que era referência no movimento estudantil. Em maio de 1964 ingressou na Universidade da Bahia (UBA/UFBA), para cursar Geologia. Data de 1966 seu ingressou no PcdoB.

Entre os amigos era conhecida por sua postura inquieta e decidida, a exemplo, uma amiga de faculdade, Teodora Costa, conta que em setembro de 1968 ao realizar o estágio para concluir o curso de Geologia foram ao campo e deveriam fazer levantamentos geológicos e voltar para apresentar os resultados na capital. E que Dinalva ao chegar teria, na verdade, feito apresentações nas escolas da região sobre a pesquisa que fariam e, de forma entusiasmada e convicta, perguntava sobre como os estudantes estavam se organizando, se tinham grêmio, denunciava a repressão e que o regime militar já tinha matado estudante.*

Não demorou muito para que Dinalva se tornasse referência no curso de Geologia. Foi pensando nisso que em 1967, três anos após seu ingresso no curso, o PcdoB propôs uma frente ampla para as eleições da União dos Estudante Baianos (UEB), indicando Antônio Teixeira, também da Geologia como presidente. Contestadora, dizia a seus colegas que seu problema é que não conseguia ficar calada.

Dinalva e outros estudantes, foram denunciados em 1969 pela diretora da escola de Geologia, Maria Alba Lacerda. Ela os acusou de serem as principais lideranças da ocupação de 1968. Dinalva foi intimada a depor e considerada como subversiva. O governo já tomava medidas para desarticular o movimento estudantil.

Apesar do incremento das perseguições aos estudantes, Dinalva terminou o curso de Geologia e mudou-se para a cidade do Rio de Janeiro, em maio de 1969, onde começou a trabalhar no Departamento Nacional de Petróleo, do Ministério de Minas e Energia. Além disso, desempenhava funções na Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC).

Na cidade carioca morou com o seu companheiro Antônio Monteiro Teixeira, com quem casou na Bahia, em um apartamento na Urca e depois em uma casa de vila na Tijuca, segundo seu irmão Djalma.

Muito discreta e mantendo o segredo necessário ao cumprimento de suas tarefas, seu irmão conta que só ficou sabendo de suas convicções políticas e do motivo de ter ido para o Rio em uma reunião de família onde puderam conversar. E sobre sua militância com o PcdoB só soube no momento em que Dinalva informou que iria para o Norte do país, porém sem muitos detalhes.

Djalma lembra que o casal ficou quase um ano no Rio de Janeiro, onde puderam também desenvolver trabalho político junto a moradores de favelas.

O casal foi para a região do Araguaia em maio de 1970, e passaram a compor o Destacamento C junto a Áurea Valadão (Elisa), Bergson Gurjão (Jorge), Maria Lúcia Petit (Maria), Telma Regina, Arildo Valadão (Ari). O destacamento C se localizava no sudoeste da serra das Andorinhas, cobrindo as bases de Pau Preto, Abóbora e Esperançinha.

Assim a militante Dinalva passa a ser a guerrilheira Dina, uma das mais conhecidas e populares combatentes do Araguaia. Dinalva adaptou-se rapidamente à região do Araguaia. A vida comum, a rotina de trabalhar e viver com os camponeses da região estreitou os laços e a confiança mútua.

Muito generosa a combatente Dina também era conhecida entre os camponeses por dar aulas e realizar partos na região, o que lhe rendeu convites para ser madrinha de crianças. Muitos são os depoimentos de camponeses da região que ressaltam a disposição dos combatentes por servir ao povo. Em entrevista a Comissão Nacional da Verdade, dona Domingas, moradora de São Geraldo conta:

Eu qualificaria eles assim como pessoas boas, pessoas que estavam a trabalho da comunidade, sem maldade. Eles inclusive cuidaram de muitas pessoas lá, pessoas doentes. Eu mesmo, tenho um menino que tá até aqui em casa. Eu "tava" grávida nessa época e até ia perder esse menino se não fosse a Dina, ela fez meu tratamento com Dr. Paulo. Sim, ih! Gostava demais, todo mundo lá era amigo... Inclusive eu levei muitos convites prá Dina, prá ela ir numa reunião conosco na Igreja, e ela nunca aceitou. Inclusive alguém deu o filho prá ela ser madrinha e ela não aceitou.”

Dina também foi responsável, junto do seu companheiro Antônio, por desenvolver o mapa local e as coordenadas geográficas, e ensinou os demais combatentes a se orientarem na mata sem maiores dificuldades. Sua formação acadêmica lhe deu arcabouço para fazer reconhecimento de lugares a partir das cores das rochas, inclinação do terreno, tipo de solo e vegetação. O renegado José Genoíno conta que o grau de precisão dos mapas feitos a partir da tecnologia ensinada por Dina era muito alto:

a gente pegava a bússola, andava tantos minutos e colocava o azimute, o norte magnético e ia diferencial. Depois, você botava aquele mapa no papel; a diferença era mínima. Era um mapa muito mais preciso do que aqueles grandão do IBGE. E foi ela que ensinou pra nós essa técnica de fazer mapa.”

Foi em 1972, com o início e posterior fracasso das operações comandadas pelo general de divisão Viana Moog, e pelo comandante e general paraquedista Hugo Abreu, que Dina do Araguaia passou a ser temida pelos soldados da reação. Ela tinha extrema habilidade em andar no mato, isso lhe rendeu entre a população a mistificação de que se transformava em borboleta e pássaro, tamanha era a facilidade de sumir dos olhares da repressão. Exímia atiradora, fustigava os soldados da reação sem eles nem saberem de onde vinha o tiro.

Há relatos de que, por volta de maio de 1972, numa empreitada na mata atrás dos guerrilheiros, um mateiro conhecido como China, guiava cerca de 15 homens do Exército. A mata era tão fechada e escura, difícil de caminhar com terra escorregadia e alagadiça que em plena 10 horas já parecia ter anoitecido. De repente o soldado que ia ao lado do sargento cai estirado no chão, seu fuzil é lançado longe, atônitos, os demais não sabiam o que tinha acontecido. O mateiro, então, gritou ao sargento que era tiro. Começam a ecoar na mata gargalhadas de mulher. No mesmo momento um dos soldados grita: É Dina! E a informação corre de soldado em soldado. Sem saber de onde vinha o tiro uns passaram a atirar para todos os lados, outros se jogam no chão. O sargento ordena que parem mas não é ouvido. Seguem-se os tiros. Como que desmaio, ele cai estirado. Um tiro lhe acerta a barriga. Os soldados correm desenfreados, largando para trás fuzis e algemas.

Essas e outras mostras de combatividade e valentia que fizeram com que Dina do Araguaia passa-se a ser temida e procurada pelas forças da reação, por um lado, e admirada pelos camponeses por outro. De firme posição, mostrou que diante dos inimigos do povo não há outra atitude a tomar a não ser a de ódio e desprezo.

A impunidade e obscuridade acerca dos crimes cometidos no Araguaia pelas Forças Armadas negou o conhecimento a respeito da morte de muitos guerrilheiros, e para outros se tem várias versões. A morte da Dina do Araguaia é uma delas. Além de versões diferentes, seu corpo nunca foi encontrado. Não havia orientação para prender guerrilheiros, a orientação era matar e sumir com os corpos. Buscando dessa forma esconder a existência da Guerrilha e da combatividade dos guerrilheiros.

Uma das versões conta que Dina foi morta no segundo semestre de 1974. Todas datam sua morte aos 29 anos. Sua família nunca desistiu de buscar por informações sobre seu paradeiro e exigir justiça.

Em algumas cidades brasileiras ruas foram batizadas com seu nome, como em São Paulo (SP), Campinas (São Paulo), Rio de Janeiro, Manaus (Amazonas), Salvador e em sua cidade natal, o distrito de Argoim (BA), onde a avenida principal foi dado o nome de Dinamonte, que é a junção de Dina com o sobrenome de seu companheiro Monteiro. Em 2003, ela foi homenageada com a Medalha Chico Mendes, do Grupo Tortura Nunca Mais – RJ. Além disso uma escola de ensino médio também recebeu seu nome em São Geraldo do Araguaia. No movimento estudantil não foi diferente, na Unifesspa a homenagem foi do Centro Acadêmico de História Dina Teixeira da Universidade Federal do Sul e Sudeste do Pará (Unifesspa), e em São Paulo, o Diretório Central dos Estudantes FMU, FIAM FAAM – Dina do Araguaia (DCE – Dina do Araguaia).

A epopéia que foi a Guerrilha do Araguaia produziu exemplos como o de Dinalva Oliveira, a Dina do Araguaia. Convicta da necessidade da violência revolucionária para transformar a sociedade, encontrou na luta armada a resposta para as mazelas que acometem nosso povo, que desde criança ela tinha conhecimento de causa. A ideologia do proletariado, apresentada a ela pelo Partido Comunista, deu resposta a sua inquietude e rebeldia. O que lhe fez tanto ser capaz de suportar a dureza do dia a dia da vida na mata nos rincões do Brasil, como capaz de realizar os atos mais heroicos e de bravura que a humanidade é capaz de descrever.

Dinalva Oliveira, heroína da do povo e da revolução brasileira! Presenta na luta!

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Notas:

* Com informações de Ary Jr (2010) e memorial da resistência de São Paulo.

**Era menção a Edson Luís, que foi assassinado no refeitório estudantil Calabouço, e carregado por uma multidão em protesto, foi velado em frente a Câmara do Rio de Janeiro.

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