Publicamos a seguir cartilha elaborada pelo MFP em 2011 para campanha que levantamos na ocasião pela punição para os criminosos, civis e militares, mandantes e executores de torturas, assassinatos e desaparecimentos forçados do regime militar de 1964-1985. A cartilha foi amplamente utilizada nos núcleos do movimento como formação política e impulsionou dezenas de manifestações, debates, denúncias e atividades de propaganda.
Cadeia para
os torturadores e criminosos do regime militar!
I –
Apresentação
O
MFP – Movimento Feminino Popular está levantando uma importante campanha pela
punição dos criminosos – mandantes e executores de torturas, assassinatos e
desaparecimentos forçados – do Regime Militar, somando forças com os familiares
e organizações que nunca desistiram dessa causa. Para que possamos defender
esta causa com um maior entendimento por todas as companheiras escrevemos esta
cartilha. Essa luta, além do mais, serve à elevação da consciência política de
todo nosso povo.
Este
é um problema que afeta terrivelmente não só o passado de centenas e até
milhares de pessoas no Brasil, mas o presente e o futuro de todo nosso povo.
Com esta Cartilha vamos demonstrar isto e contribuir para levantar um grande
movimento nacional pela punição dos criminosos do Regime Militar. Para isto a
cartilha deve ser utilizada como material de estudo constante e também de
propaganda do movimento.
Desde
o início desta luta, as mulheres tiveram papel decisivo na mobilização e pela
pressão tiveram importantes conquistas. Nosso dever é encampar esta luta do
povo brasileiro, e que faz parte da luta por justiça, democracia e pela
transformação de nossa sociedade.
Para
fazer uma exposição esclarecedora sobre a questão é necessário remontar à história
recente do país, do processo político nacional marcado por regimes fascistas, à
luta de nosso povo por uma verdadeira democracia. Apesar de toda riqueza
natural que possui e de uma certa industrialização, o Brasil segue sendo um país
atrasado cuja imensa maioria da população é muito pobre frente uma brutal
concentração de renda por uma ínfima minoria. As crises econômicas são crônicas
com desemprego massivo, salários arrochados e os sistemas públicos de saúde e
educação extremamente precários. Tudo isto tem uma base e causa histórica da
dominação estrangeira secular. A dominação imperialista segue subjugando a Nação
e espoliando o povo, mantendo o país na condição semicolonial e semifeudal.
Este sistema em que uma grande burguesia unida ao latifúndio a serviço da
dominação imperialista determina a natureza do Estado e a situação geral da
sociedade.
II – O
Estado Brasileiro
O
Estado brasileiro é um velho Estado semifeudal e semicolonial de grandes
burgueses e latifundiários, serviçais do imperialismo. O que isto quer dizer?
Quer dizer que este Estado ao longo dos séculos se estruturou como instrumento
das classes exploradoras (grandes burgueses e latifundiários) e do imperialismo
para dominação e opressão do povo e de subjugação da Nação Brasileira. Por isto
mesmo nossa nação não é independente, não há autonomia política, econômica e
cultural no nosso país. E os governos não passam de meros gerenciamentos de
turno, que se revezam seguindo estritamente as orientações das potências
estrangeiras exploradoras de nossa pátria.
O
povo brasileiro, ao contrário do que se difunde, sempre se rebelou contra todo
tipo de exploração, dominação e opressão. É por isto que a estrutura principal
do Estado são as forças armadas que garantem sob a ponta de fuzis os mandos e
desmandos das classes dominantes.
Muitas
lutas e rebeliões populares e democráticas contra o latifúndio, a miséria, a
pobreza, e pela emancipação da pátria ocorreram ao longo de séculos, a maioria
delas foram sufocadas pelas forças repressivas do Estado, através da guerra,
tortura e matanças de milhares de massas trabalhadoras e de suas lideranças.
Por
causa das crises crônicas na economia e na política e das revoltas populares,
muitas vezes as classes dominantes, para reestruturar o poder de Estado,
mudaram a forma de governo, porém nenhuma dessas mudanças alterou a essência
deste Estado.
No
último século, por exemplo, transitou-se de regimes fascistas declarados como o
“Estado Novo” de 1937 a 1945 com Getúlio Vargas e o Regime Militar de 1964 a
1985, para as chamadas “democracias”, em que o processo eleitoral é usado para
iludir o povo de que seria representado nos cargos de poder, passando a falsa idéia
de que o povo escolhe as leis, a política e os governantes do país.
O
fato é que este velho Estado nunca representou todo o povo como insistem os
donos do poder, os oportunistas e demagogos. Ele representa diretamente e
somente os interesses da grande burguesia, do latifúndio e do imperialismo, os
quais são opostos aos interesses do povo e da nação brasileira.
III –
O Regime militar de 1964: necessidade da dominação imperialista
Para
que possamos entender o que representa a luta pela punição dos criminosos do
Regime Militar – mandantes e executores de torturas, assassinatos e
desaparecimentos forçados – que durou mais de 20 anos (1964 a 1985) é necessário
passar por uma breve retrospectiva dos acontecimentos, da luta das massas, da
crise existente no país à época e de como se estruturaram as classes dominantes
para garantir o seu poder a ferro e fogo.
Muitos
denominam este período como “ditadura militar”, mas consideramos a denominação “regime militar” mais correta e científica,
pois como apresentamos mais acima, desde a sua formação o Estado brasileiro
sempre foi uma ditadura contra o povo e democracia para as classes dominantes
exploradoras. O regime militar foi uma das diferentes formas que esta ditadura
adquiriu.
O
regime instalado com o golpe militar-civil foi uma necessidade para o
imperialismo barrar as ameaças de perder o controle sobre o país, de suas
fontes de matérias primas, das riquezas minerais e florestais, da exploração de
força de trabalho barata e do mercado cativo para as mercadorias de suas
empresas monopolistas. Para assegurar este controle insuflaram, orientaram e
apoiaram o regime dos “gorilas” que atacou a todos opositores, impondo por mais
de 20 anos sobre o país, a nação e o povo, um regime de terror, perseguições,
prisões, torturas, assassinatos e desaparecimentos forçados.
III.1- Antecedentes
Os
anos de 1960 se iniciaram com uma efervescência de todo o movimento popular no
Brasil. Ainda na década de 1950 aconteceram as lutas camponesas de Porecatu no
Paraná e de Trombas e Formoso em Goiás. Nelas, os camponeses posseiros
resistiram em suas terras de armas nas mãos contra grileiros (grandes fazendeiros
que forjavam falsas escrituras de terras), seus pistoleiros e as forças
policiais, saindo vitoriosos da luta. O movimento camponês se organizava através
das Ligas Camponesas e principalmente no nordeste foi muito forte. A questão da
terra nunca resolvida no país ganhava, cada vez mais, uma repercussão política
e ameaçava o poder dos latifundiários e, por decorrência ameaçava a dominação
da grande burguesia e do imperialismo.
Em
1963 o presidente da república Jânio Quadros renuncia e assume o seu vice João
Goulart com um discurso nacionalista, declarando compromisso perante o povo de
atender suas reivindicações das chamadas “reformas de base”, como a Reforma Agrária,
Reforma Urbana e a Reforma Universitária. O discurso de João Goulart não
agradava os setores mais reacionários do Estado, que viam com grande ameaça a
possibilidade do povo se fortalecer e fazer uma revolução no país.
Neste
período estavam acontecendo processos revolucionários no mundo inteiro, em que
o povo mudava seu destino. 1/3 da população mundial estava sob o regime dos
operários e camponeses, com o Socialismo e as Democracias Populares. A imprensa
dos exploradores, as agências do imperialismo e as igrejas faziam alarido sobre
uma suposta “ameaça do comunismo” para aterrorizar a classe média e o povo
desinformado.
Os
grupos de poder mais ligados ao imperialismo no Brasil passaram a mobilizar
setores da sociedade para justificar a implantação de um regime fascista. Altos
burocratas, industriais, banqueiros, latifundiários passaram a instigar a crise
econômica para desestabilizar o governo de João Goulart, enquanto o clero usava
as missas e cultos religiosos para amedrontar as pessoas. Dias antes do Golpe
aconteceu a “Marcha com Deus pela família e pela liberdade” organizada
juntamente com as altas cúpulas da igreja católica. Exigiam mão pesada do
Estado para conter os movimentos populares e contra a implantação do “comunismo”
no Brasil. Assim, com a classe média assustada, o golpe de Estado parecia se
justificar colocando o alto comando militar para governar diretamente o País.
Imediatamente lançaram todo tipo de atrocidades contra o povo e suas lideranças,
na tentativa de liquidar qualquer mobilização e organização popular.
III.2 – O Golpe
Em
1º de abril de 1964, o que eram rumores, passou a se efetivar enquanto um golpe
de Estado organizado em todo o país. O General Humberto de Alencar Castello
Branco passou a exercer o poder político com a deposição do presidente João
Goulart. A alta cúpula das forças armadas passou a ter poderes de cassar
mandatos de deputados, governadores. Através dos chamados Atos Institucionais
os sucessivos generais no poder legalizaram todo o tipo de arbitrariedades e
crimes. Os partidos políticos foram extintos sendo permitidos somente a Arena e
o MDB. O Congresso Nacional foi dissolvido e reaberto como farsa para manter a
aparência de democracia, onde quem não dissesse amém ao general de plantão
tinha seu mandato fatalmente cassado, perseguido, preso, torturado e mesmo
assassinado como foi o caso do deputado Rubens Paiva.Todas as eleições passaram
a ser indiretas e interventores eram designados para assumir todos os cargos
executivos.
Mas
todas estas medidas tinham o objetivo principal de atingir as organizações
populares. Diversas lideranças populares que haviam se destacado nas mobilizações
no período anterior foram presas. A UNE, o CGT e organizações democráticas
foram colocadas na ilegalidade. As Ligas Camponesas foram perseguidas destruídas.
Fazer greve era ilegal e os sindicatos que tinham direções combativas sofreram
a intervenção do Ministério do Trabalho. Era proibido qualquer tipo de manifestação
contra o regime. As pessoas foram proibidas de se organizar politicamente.
A
imprensa foi censurada, não era permitida nenhuma publicação que criticasse os
militares ou seu regime. Muitos jornalistas foram perseguidos, jornais e
revistas fechados e publicações proibidas. Artistas também foram perseguidos,
manifestações culturais democráticas foram censuradas.
Um
Estado de Sítio permanente foi instaurado de forma que as pessoas não tinham o
menor direito de exercer seus direitos de cidadãos e qualquer rumor de
descontentamento era considerado crime contra o Estado. Prisões e torturas
passaram a ser rotineiras e execuções sumárias eram justificadas como “troca de
tiros de terroristas com agentes de segurança do Estado”. O chamado “estabelecimento
da ordem” foi criado sob uma verdadeira atmosfera de terror.
As
condições de vida do povo não melhoraram, pelo contrário, um terrível arrocho
salarial atingia todos trabalhadores que ainda tiveram pisoteados direitos
duramente conquistados. As transnacionais (empresas estrangeiras multinacionais) tomaram de assalto e de
vez a economia nacional. As condições de trabalho pioravam a cada dia, enquanto
os lucros dos imperialistas iam até as alturas.
III.3- A resistência ao regime e as organizações
Revolucionárias
É
claro que tudo isto não aconteceu sem muita resistência popular. Mesmo na
ilegalidade e clandestinidade, sindicatos, organizações estudantis e demais
organizações sindicais e políticas continuaram a se organizar e protestar.
Com
crimes políticos horrendos e tamanha brutalidade cresceu a contestação contra o
regime. Parte da classe média que antes tinha apoiado o golpe militar tomava
consciência do erro que havia cometido, começava a se manifestar contra, com
manifestações e protestos públicos. Congressos e reuniões eram organizados
secretamente. Partidos revolucionários se dedicavam à propaganda contra o
regime e por uma revolução para livrar o país da “ditadura”.
Em
1968 aconteceu uma importante manifestação estudantil no Rio de Janeiro. O
assassinato do Estudante Edson Luis no restaurante calabouço causou comoção
muito grande e uma manifestação de mais de 100 mil pessoas foi realizada com a
bandeira política contra o regime dos militares.
Mas
a resistência principal ao regime foi realizada através da luta armada na
cidade e no campo. Valorosos brasileiros, homens e mulheres, jovens e maduros,
lançaram-se numa luta desigual contra o fascismo. Estudantes, professores, operários
e camponeses se dedicaram a organizar a luta revolucionária no país. Guerrilhas
foram realizadas na cidade e no campo. A mais importante delas foi a Guerrilha
do Araguaia que aconteceu no sul do Pará, dirigida pelo Partido Comunista do
Brasil, entre 1972 e 1974. Na época o Partido Comunista do Brasil estava se
reconstruindo com uma linha revolucionária da Guerra Popular, no objetivo de
tomar o poder para o povo no Brasil. Foram necessárias 3 expedições das forças
armadas para derrotar a guerrilha. Foram muitos os heróis e heroínas do nosso
povo neste período que entregaram generosamente suas vidas, acreditando num
futuro de democracia, liberdade e prosperidade para as próximas gerações.
Toda
a luta de resistência ao regime militar-fascista teve uma importância muito
grande, pois demonstrou que nenhuma força, mesmo armada até os dentes pode
derrotar o povo e que, após cada batalha perdida o povo recomeçaria tudo de
novo corrigindo os erros até triunfar um dia. Toda a resistência semeou esperança
e por menores que fossem atingiram vitórias importantes.
III.4 – Tortura, assassinatos e
desaparecimentos forçados
Durante
os anos de Regime Militar todo tipo de aparato de terror foi montado. Para se
informarem sobre as organizações opostas ao regime, os militares montaram o
SNI-Serviço Nacional de Informações e recrutaram centenas de milhares de
funcionários públicos para espionar todas as pessoas por todas as partes do país.
Orientados pelas agências do governo norte-americanos instalaram nos quartéis
verdadeiros centros de tortura. Nestes porões eram usados equipamentos para
aplicação de choques elétricos em várias partes do corpo, afogamentos,
pau-de-arara, porretes entre muitos outros. As prisioneiras sofreram toda sorte
de abusos e humilhações, foram estupradas e, como vários prisioneiros, tiveram órgãos
decepados. Pais e mães sofriam estes abusos e crueldades na frente de seus
filhos ou eram obrigados assistir torturas de companheiros e entes queridos.
Todo o tipo de barbaridade de lesa humanidade foi perpetrado por esses sanguinários.
Os piores crimes contra o povo e a humanidade
foram cometidos pelos generais e seus comandados das forças armadas e forças
policiais brasileiras. Estruturaram um esquema de operações de prisões,
torturas e aniquilamento daqueles que contestavam seu poder. Muitas famílias
perderam seus filhos e filhas, maridos e esposas numa perseguição feroz. Mesmo
na obrigatória clandestinidade desde o estabelecimento do regime, muitos
revolucionários foram presos e torturados, muitos torturados até a morte e
centenas desaparecidos até os dias de hoje.
Como
sabiam que toda esta barbaridade não seria aceita, não admitiam que faziam tais
atrocidades. Tudo veio à tona através da denúncia de pessoas que foram presas,
torturadas ou presenciaram a tortura de seus companheiros na prisão.
Para
justificar tamanha atrocidade, muitas vezes ao declarar a morte de algum
perseguido político, simulavam que havia acontecido um “tiroteio”, mesmo que
nas fotos registradas houvessem marcas de tortura e assassinato. Mas muitas
mortes eles não podiam declarar. Praticaram corriqueiramente ocultação de cadáveres,
com cemitérios clandestinos. Muitos deles até hoje continuam com sua localização
oculta.
Os
opositores ao regime que decidiam lutar, os revolucionários, eram presos,
condenados, torturados e executados sem nenhum direito de defesa, sem nenhum
tribunal em que pudessem declarar os seus pensamentos.
Exemplo
de como a ocultação de cadáveres era clara orientação destes facínoras foram os
acontecimentos na região do Araguaia no sul do Pará, onde os mais de 62
guerrilheiros do Partido Comunista, em sua quase totalidade ainda hoje
continuam declarados como “desaparecidos”. Tudo isto mesmo com relatos e
declarações de moradores da região que testemunharam a tortura e assassinados
praticadas pelos militares.
Muitos
relatos e denúncias seguiam no boca a boca e pela imprensa clandestina. Quanto
mais público isto se tornava, mais ódio despertava no povo e em consequência, a
mobilização contra o regime militar.
É
importante destacar como toda prática desenvolvida pelo regime militar era
apoiada e orientada pelo EUA. Os golpes militares foram uma política orientada
para toda a América Latina. Países como Argentina, Chile e Uruguai também
passaram por processos bastante semelhantes. Havia uma conexão entre os
comandos dos exércitos de vários países, com a orientação do EUA. Existiam
escolas de treinamento de torturas, como a chamada “escola das Américas”, onde
os militares brasileiros tiveram uma grande importância, para o treinamento de
torturadores por todo o continente.
IV – A
luta pela liberdade dos Presos Políticos e a
Campanha pela “Anistia”[1]
IV.1 – O movimento de massas em geral
No
final da década de 1970, o desgaste do regime militar já era acentuado, as denúncias contras seus
crimes e a corrupção por um lado e a crise econômica e os clamores por
democracia por outro, não paravam de crescer. O Movimento Popular tomou novo
impulso, greves combativas passaram a acontecer mesmo sendo ilegais. O
Movimento Estudantil também ressurgia combativo e desafiando o regime cada dia
mais antipatizado pelo povo.
A
opinião publica em geral passava a contestar de forma mais aberta o regime dos
militares. Em todo esse período, muitos lutadores estavam ameaçados e tinham
que se refugiar no exterior ou seguir vivendo na clandestinidade dentro do próprio
país, sempre com o risco de serem presos pelo “crime” de ser contra o regime
militar.
IV.2- O movimento de mulheres
No
seio do Movimento Popular se acirrava a luta política sobre como dar fim ao
regime militar-fascista. Os oportunistas clamavam por um acordo com os
militares e pediam uma anistia para os presos políticos e todos os perseguidos.
Os revolucionários defendiam a derrubada completa do regime e a instalação de
um governo democrático popular e exigiam a imediata liberdade de todos os
presos políticos. Em 1975, em meio a esta luta, um grupo de mulheres de classe
média, lideradas por Tereza Zerbini, e baseadas mais em sentimentos humanitários,
tomaram a iniciativa de levantar a campanha pela Anistia. Assim surgiu o Movimento Feminino Pela Anistia. Este
Movimento, apesar da visão ingênua teve o mérito de levantar uma campanha pela
soltura dos presos políticos e anulação de todos os processos e perseguições
por motivo político. Embora seu conteúdo fosse reformista e não tocava na
necessidade de liquidar com toda a estrutura que deu suporte ao regime
militar-fascista, ajudou muito em levantar um clamou nacional pela liberdade e
pela democracia. Logo o movimento pela Anistia ganharia mais força com a
integração das organizações revolucionária, porém seguia com ilusões
reformistas e se tornaria um movimento de massas no país.
O
programa da luta pela Anistia consistia em:
- Erradicação da
tortura;
- Esclarecimento das
circunstâncias dos crimes do regime militar;
- Localização dos
restos mortais dos desaparecidos políticos;
- A nomeação,
responsabilização e punição dos torturadores e assassinos de presos políticos e
os que continuassem a praticá-los.
A
palavra de ordem era: “PELA ANISTIA AMPLA, GERAL E IRRESTRITA”. Ampla e geral
porque deveria atingir todos os perseguidos pelo regime militar, fossem eles
presos no país, exilados, servidores públicos, sindicalista e etc. Irrestrita
porque deveria significar um verdadeiro fim às perseguições políticas sendo
garantido o fim do terrorismo de Estado.
IV.3 – A Lei da Anistia de 1979
Apesar
da grande mobilização, os gorilas tendo à frente o general Figueiredo como
tirano de plantão e contando com a ação dos oportunistas, habilmente
conseguiram distorcer as reivindicações do movimento popular e pactuaram no
Congresso nacional sob a denominação de “Lei da Anistia Ampla Geral e
Irrestrita”, um texto cheio de brechas e lacunas que favoreciam a interpretação
de conciliação nacional e de virada de página da história. O que deveria ser
uma anistia para os perseguidos pelo regime, passou a ser uma anistia que
preventivamente impedia que os criminosos mandantes e praticantes de tortura,
assassinatos e desaparecimentos políticos pudessem ser processados e julgados
pelos crimes hediondos que cometeram.
V – “Redemocratização”,
a nova farsa
Devido
a forte pressão popular o desgaste do regime militar só aumentava. Ainda em
fins de 1970 os planos das classes dominantes mudavam. Já haviam desestruturado
bastante as organizações revolucionárias assassinando seus principais
dirigentes. Ou seja, com a eliminação dos revolucionários mais firmes e mais
preparados, as posições ideológicas mais avançadas, revolucionárias de fato,
perderam força seio do movimento popular, que acabou mais uma vez arrastado
para as posições reformistas e oportunistas. Foi o que ocorreu com toda ilusão
eleitoreira da democracia burguesa em que a imensa maioria das organizações
denominadas por esquerda e comunista do país se enveredaram.
Era
necessário dar uma cara nova para o Estado, transitando de um regime fascista
declarado para um regime civil em que houvesse eleições para os cargos
legislativos e de governo, com bastante maquiagem, simulando uma democracia.
Desde a transição do General Geisel para o general Figueiredo como presidente,
já haviam acordos sobre os planos de como se daria esta transição.
Desde
o gerenciamento de Geisel que havia uma luta no meio dos militares, entre os
que não aceitavam ceder nada e manter o regime com os que defendiam não ser
mais possível mantê-lo, que era necessário fazer uma transição “lenta, gradual
e segura”, antes que rebeliões populares derrubassem o regime, abrindo caminho
para mudanças mais profundas. Após lutas intestinas, com que os grupos
militares mais extremados realizaram atentados terroristas contra democratas e
assassinaram militantes que não estavam na luta armada e que, inclusive eram
contra a luta armada, tal como os assassinatos do jornalista Vladimir Herzog e do operário Manuel Fiel Filho na
prisão, o que só aumentou o clamor contra o regime moribundo e que com a
chegada das eleições para o Colégio Eleitoral, viu desatar-se as torrentes de
manifestação pelas eleições diretas para presidente do país.
Houveram
grandes manifestações por eleições diretas para governadores e para presidente
da república, e apesar do primeiro governo civil ter se dado com a eleição
indireta de Tancredo Neves em 1984, somente em 1988 aconteceram as primeiras
eleições diretas. A transição segura estava feita, com a dura realidade de que
os mesmos carrascos do regime militar continuarem livres e dentro dos aparatos
do Estado. Mudaram a fachada para esconder as estruturas podres do Estado que
continuou servindo aos interesses do latifúndio, da grande burguesia e do
imperialismo.
VI – O debate da “Lei de Anistia” no momento atual
Durante
todos os anos que se seguiram, os familiares dos assassinados e desaparecidos
pelo regime militar-fascista continuaram as buscas dos restos mortais ou
paradeiro de seus filhos e filhas, mães e pais, esposas e maridos, irmãos e irmãs.
Descobriram ossadas, cemitérios clandestinos, tudo isto sem nenhuma ajuda de
qualquer governo. Nenhum dos gerenciamentos civis, posteriores ao regime
militar, tiveram interesse de sequer tentar amenizar as dores dessas famílias,
muito menos de apurar os crimes, formalizar culpa, julgar e condenar os responsáveis,
mandantes e executores, militares e civis, tal como grandes empresários que
desempenharam papel primordial no regime e passaram ilesos até os dias atuais.
Mas
há os que continuam resistindo e lutando pela punição dos crimes cometidos pelo
regime de 1964 a 1985. Muitos esperaram que o gerenciamento do PT- Luís Inácio/Dilma
faria esforço para resgatar a história e punir os velhos carrascos.
Vejamos as
medidas promovidas por este gerenciamento:
-
Impedimento da abertura de arquivos secretos dos militares, que facilitariam as
buscas pelos restos mortais pelos familiares dos desaparecidos políticos e
todos os interessados em revelar a verdade na Hitória;
-
Negação da decisão do Tribunal Interamericano de Direitos Humanos, do qual o
Brasil faz parte e que julgou o Estado Brasileiro como responsável pelos crimes
de tortura, execução sumária e ocultação de cadáveres no caso da Guerrilha do
Araguaia (1972/1974), o que o obrigaria a apurar os fatos e condenar os
militares envolvidos.
-
Elaboração de um “novo” PNDH (Plano Nacional de Direitos Humanos) que reafirma
os mesmos mandamentos da Lei da Anistia de 1979, protegendo os militares.
-
Formação de uma “comissão da verdade”, formada por militares e membros do
governo que terão 2 anos para “esclarecer” os fatos. Na verdade comissão da
mentira, para tentar tapear mais uma vez e jogar para debaixo do tapete a
verdade histórica, protegendo os facínoras que promoveram as torturas, os
assassinatos e os desaparecimentos forçados.
Não
há interesse de nenhum desses gerenciamentos em esclarecer nada, pois eles
representam, como grupos de poder, as classes reacionárias que comandam o velho
Estado cujos agentes têm as mãos cheias de sangue neste capítulo negro de nossa
historia.
VI – A
necessidade da punição dos torturadores e seu significado histórico
A
luta pela punição dos criminosos, mandantes e executores de torturas,
assassinatos e desaparecimentos forçados, não tem tempo para acabar. Pensar que
esquecemos a história é um grande engano. Esta não pode ser apagada. O sangue
dos lutadores do povo rega a luta nos dias atuais. Condenar seus torturadores e
algozes é prestar contas históricas e continuar a causa pela democracia nova. Não
nos levantar nesta luta ou aceitar passivamente as ordens deste Estado é ser
conivente com a continuidade destas barbáries que seguem existindo nos dias
atuais. Torturadores e assassinos, bem como seus mandantes, vivem a solta por aí,
como se fossem pessoas de bem, enquanto os aparatos de perseguição e tortura
contra o povo pobre só tem se sofisticado e novas políticas repressivas,
presididas por renegados como Dilma, Genoíno entre outros, seguem operando e
massacrando o povo pobre nas vilas, favelas, nos campos e praticamente em todos
presídios e delegacias do país.
A compreensão e colocação sintética da questão:
A correta compreensão deste problema e o justo
enfoque de sua resolução deve partir de que um ajuste de contas do povo com
seus algozes, como ficou demonstrado na experiência histórica das revoluções
proletárias, só pode ocorrer com a vitória da revolução e destruição do velho
Estado genocida das classes dominantes e estabelecimento do novo Estado
popular. Neste sentido, no estágio atual da nossa luta devemos afirmar frente
aos crimes do regime militar e todos os demais do velho Estado brasileiro a
seguinte síntese: Nem perdão, nem esquecimento e nem reconciliação: punição
para os criminosos do regime militar, civis e militares, mandantes e
executores, de torturas, assassinatos e desaparecimento forçados.
Fundamentação e justificativa da necessidade da
punição
1- O terrorismo de Estado é a forma da
contrarrevolução atacar a luta revolucionária e democrática do povo pela sua
libertação e pela conquista de uma nova sociedade sem exploração e sem opressão.
A prisão, a tortura, o assassinato e o desaparecimento forçado são as formas do
terrorismo de Estado com que a contrarrevolução do velho Estado reacionário e
genocida combate o povo, suas organizações de massas e culturais e sua
vanguarda organizada.
2- Juridicamente a Lei de Anistia passa por cima
dos preceitos do senso comum estabelecido nos estatutos e convenções
internacionais, segundo os quais os crimes de tortura e desaparecimento forçado
são imprescritíveis. Portanto, há que
revogar tal lei que impede a apuração, identificação, acusação, processo e
condenação dos crimes tipificados.
3- Do ponto de vista moral e cultural as classes
dominantes buscam legitimar a situação de que, toda vez que o movimento popular
em ascensão ameaçar a estabilidade do seu sistema de exploração, poderão lançar
mão do fascismo aberto para debelar a ameaça e retornar à “estabilidade” com
leis semelhantes para a “reconciliação nacional”.
[1]
Anistia – Ato do poder público
que declara impuníveis delitos praticados até
determinada data por motivos políticos ou penais, ao mesmo
tempo que anula condenações e suspende diligências
persecutórias. (Dicionário
Houaiss).
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